Exclusivo: dívida da Prefeitura de Goiânia com hospitais ultrapassa R$ 250 milhões, aponta MP

A dívida da Prefeitura de Goiânia com os hospitais particulares e filantrópicos ultrapassa os R$ 250 milhões, aponta levantamento do Ministério Público de Goiás (MPGO). O levantamento, feito em maio por meio de uma ação civil pública que obrigou o município a quitar os débitos, identificou ainda o fechamento de leitos de Unidades de Tratamento Intenso (UTI) e enfermaria na cidade. Coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Saúde do MPGO, Marlene Nunes, disse ao Jornal Opção que o volume total da dívida só será conhecido através de uma auditoria nas contas da Prefeitura de Goiânia.

O Jornal Opção entrou em contato com a Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia (SMS) sobre a questão, mas até o fechamento desta reportagem, a demanda ainda não havia sido respondida. O espaço segue aberto.

Conforme Marlene Nunes, o MP apurou “que muitas pessoas estavam permanecendo em UPAs e Cais por um tempo muito elevado à espera de um leito hospitalar”. Ela conta que foram instaurados procedimentos e inspeções que detectaram o rompimento de contrato de prestadores de serviço com a Prefeitura de Goiânia, a exemplo do Hospital Ortopédico e o Hospital da Criança, “por falta de pagamento”.

Prosseguimos nas apurações e vimos que havia hospitais dispostos a receber pacientes, mas a Secretaria [Municipal de Saúde] não estava pagando. O que apuramos é que todo esse imbróglio é problema de acerto, problema de pagamento

Encolhimento dos leitos

A promotora do MP relata que o acúmulo de dívidas e a quebra de contrato dos hospitais “gerou um encolhimento da oferta de leitos de UTI na Capital“. A instituição chegou a conseguir decisão liminar favorável que obrigou a Prefeitura a quitar o montante, mas o Paço recorreu da decisão e conseguiu suspender a liminar por um período. “Fizemos com que a liminar fosse reestabelecida e estamos na fase de cumprimento da decisão”, revela Nunes.

Além do encolhimento do número de leitos de UTI, o Ministério Público também identificou que o número de leitos de enfermaria teve encolhimento de igual modo. “É curioso que muitos leitos não estão sendo ocupados, mas eles estão habilitados no SUS. Por que eles não estão sendo ocupados? Porque o Município não está pagando o prestador e não encaminha o paciente”, explica.

Dívidas

Em junho deste ano, o responsável técnico do Hospital Gastro Salustiano informou a existência de um débito da SMS referente ao custeio de diárias de UTI adulto tipo II e enfermaria destinada a pacientes com Covid-19 no período de maio a junho de 2022. O valor total, segundo a ação civil pública, é de R$ 203,1 milhões.

Foi apurado ainda “a existência de dívidas com praticamente todas as unidades contratualizadas”, diz o documento. Na Santa Casa, a dívida chega a cerca de R$ 18 milhões, no Hospital Jacob Facuri seriam R$ 20 milhões; Araújo Jorge, R$ 34 milhões; Hospital Ortopédico. R$ 1 milhão; São Judas Tadeus, R$ 6 milhões, além de um total momentâneo de cerca de R$ 102 milhões que não teriam sido repassados para as unidades com contrato, embora os repasses tenham sido encaminhados pelo Ministério da Saúde.

Em outubro, o secretário municipal de saúde de Goiânia, Wilson Pollara, disse ao Jornal Opção que chegou ao comando da pasta com uma dívida de mais de R$ 260 milhões, mas que teria conseguido quitar aproximadamente 70%. A informação é contestada por diretores médicos e sindicatos, que apontam o atraso de salário de médicos e de pagamentos referentes aos atendimentos, inclusive de verbas carimbadas do MS.

Secretário Municipal de Saúde, Wilson Pollara, durante prestação de contas na Câmara Municipal | Foto: Wesley Menezes

Pollara voltou a repetir o discurso de que quitou parte dos débitos com os prestadores de saúde, no entanto, não soube especificar qual seria o valor atualizado da dívida. “Quando assumi a pasta peguei R$ 265 milhões em dívidas. Hoje esse número é bem menor mas não consigo especificá-lo”, disse.

Habilitação de 20 leitos em 10 dias

O prefeito eleito de Goiânia, Sandro Mabel (UB), se reuniu na tarde desta segunda-feira, 25, com os secretários estadual e municipal de Saúde, Rasível Santos e Wilson Pollara, para tratar da crise de falta de UTIs em Goiânia.

Mabel afirmou que 20 leitos de UTI devem ser habilitados, de forma imediata, para atender a demanda na saúde da Capital. “Estamos agindo em três frentes, gestão atual, próxima gestão e gestão estadual para suprir a necessidade da capital. Isso significa a abertura imediata de 20 leitos e nos próximos dez dias novos leitos deverão ser abertos diariamente. O número de leito a serem abertos imediatamente pode subir para 30, caso a Santa Casa abra mais 10 leitos e, caso necessário, teremos como abrir até 40 leitos”, explicou durante coletiva.

Redução dos leitos provocou quatro mortes

À espera por leitos de UTI na Capital, ao menos quatro pacientes pereceram na fila da saúde em Goiânia. O técnico de informática, Luiz Felipe, 30 anos, morreu no último sábado, 23, enquanto aguardava vaga no Hospital de Doenças Tropicais (HDT), único hospital que tratava da doença do paciente.

Severino Ramos Vasconcelos Santos l Foto: Reprodução.

Severino Ramos Vasconcelos Santos, 63, aguardava a transferência para a unidade de tratamento intensivo após uma fratura no fêmur após uma queda. Ele havia sido internado na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Jardim Itaipu em 18 de novembro, mas o quadro do paciente se agravou, apresentando esforço respiratório, rebaixamento do nível de consciência, hipoglicemia, hipotensão arterial e episódios febris.

O Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) chegou a impor que o município de Goiânia encontrasse uma vaga em caráter de urgência ou arcasse com os custos do leito na rede privada. A vaga não foi encontrada e o paciente morreu cinco dias após ser internado na UPA.

Katiane de Araújo Silva l Foto: Arquivo.

Katiane de Araújo Silva, 36, foi diagnosticada com dengue hemorrágica e morreu na fila de esperava por uma vaga de UTI na Capital. Ela foi internada no dia 19 de novembro e veio a óbito no dia 22 após apresentar sintomas mais graves. A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) informou que o caso está sendo investigado pelo Serviço de Verificação de Óbitos (SVO).

Janaína de Jesus l Foto: Reprodução.

Janaína de Jesus, 29 anos, deu entrada com dengue hemorrágica na UPA do Jardim Itaipu. Ela morreu três dias após ser internada, enquanto aguardava transferência para a UTI. O prontuário da jovem também indicava falecimento por dengue hemorrágica, mas a nota da SMS diz que “conforme laudo médico, Janaína de Jesus faleceu em decorrência de complicações causadas pela diabetes Mellitus”.

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