Investigado na Fames-19 abasteceu suposta empresa de facção criminosa com mais de R$600 mil, aponta a PF

Por Fenelon Milhomem, editor do Jornal Opção Tocantins

Três meses depois do início da Operação Fames-19 — que investiga desvio de R$5 milhões em verbas para aquisição de 1,6 milhão de cestas básicas durante o período de pandemia da Covid-19, pelo governo do Tocantins —, surgem novas informações sobre o caso. Duas empresas, que estão sendo investigadas, pertencem ao Primeiro Comando da Capital (PCC), de acordo com apuração da Polícia Civil do Estado de São Paulo.

Segundo o inquérito da Operação Fames-19 da Polícia Federal (PF), documento ao qual o Jornal Opção Tocantins teve acesso, as empresas investigadas são a VB Inter Holding e a 4TPag. Ambas movimentaram, no âmbito da operação, quantias que, somadas, chegam a quase R$1 milhão.

As duas empresas são de propriedade de Matie Obam, apontada como laranja em um esquema do PCC, liderado por seu padrasto, João Gabriel de Mello Yamawaki. O nome dela aparece como proprietária de outras empresas ligadas ao crime organizado no Tocantins. As duas empresas tiveram movimentações feitas por e para Welber Guedes de Morais, apontado pelo inquérito como um dos principais articuladores do esquema e a ligação entre as empresas e os investigados na Operação Fames-19.

Em 2019, Welber Guedes foi preso no âmbito da Operação Via Avaritia, que investigava um esquema de corrupção e desvio de recursos públicos em contratos de pavimentação asfáltica no Tocantins, incluindo acordos firmados com a Agência Tocantinense de Transportes e Obras (Ageto). À época, a prisão foi revogada pelo juiz Fabiano Gonçalves Marques, que destacou que o empresário era réu primário, portador de “bons antecedentes” e possuía endereço fixo e ocupação lícita, afirmando também que as investigações não seriam prejudicadas com a sua liberdade.

Ativas, as duas empresas, supostamente do PCC, aparecem no cadastro da Receita Federal com endereços localizados no JK Business Center, em salas vizinhas. A VB Inter Holding na sala 1101-A e a 4TPag na 1101-B. A VB é cadastrada como uma empresa de “produção de filmes” e a 4TPag como “consultoria em tecnologia da informação”.

Em agosto, Matie Obam teve uma série de restrições, como a proibição de sair da cidade de Mogi das Cruzes (SP), onde mora com sua família. Segundo a polícia, quem opera as empresas do PCC é o padrasto de Matie Obam, João Gabriel Yamawaki. A família morava em um condomínio de luxo, em Mogi das Cruzes. 

João Gabriel Yamawaki foi preso em agosto, com outras 12 pessoas. Ele é suspeito de lavar dinheiro para o PCC. Esse dinheiro estaria supostamente sendo utilizado para financiar campanhas eleitorais no interior do Estado de São Paulo.

A Polícia Civil de Mogi das Cruzes (SP) revelou que o esquema de lavagem de dinheiro operado pela fintech 4TBank movimentou mais de R$ 8 bilhões nos últimos cinco anos. O esquema utilizava empresas de fachada para mascarar operações financeiras ilícitas, como as duas empresas, registradas em Palmas, que estão envolvidas na Operação Fames-19 e foram utilizadas pelo PCC. Essas empresas, operadas no nome de Matie Obam, serviam como “braços” da fintech e tinham atividades que iam desde a produção alimentícia até consultoria contábil, muitas vezes utilizando nomes de estabelecimentos reais de Palmas, para as ocultar.

A polícia chegou até a empresa depois de uma apreensão de drogas em 2023, na casa de Fabiana Manzini, mulher de Anderson Manzini, apontado como um dos líderes do PCC, preso desde 2002. 

Anderson Manzini atua como braço direito de João Gabriel. Na época, na casa da mulher do líder do PCC, foram apreendidos 28 kg de maconha e 8 kg de cocaína.

Ligação com o Tocantins

A ligação das duas empresas com o Tocantins e o desvio dos valores destinados à compra de cestas básicas está relacionada ao empresário Welber Guedes de Morais. Durante a Operação Fames, que incluiu a quebra do sigilo bancário de Welber Guedes, foram identificados aportes financeiros em sua conta que totalizam R$ 4.029.275,22. Esses valores são provenientes de diversas empresas contratadas pelo governo do Tocantins para o fornecimento de cestas básicas.

Gráfico que consta no inquérito policial da Fames-19 | Print: Jornal Opção Tocantins

O empresário também recebeu, segundo as investigações, depósitos da empresa VB Inter Holding Ltda. no valor de R$ 165 mil, e depositou a quantia de R$ 615 mil para a 4TPag, ambas pertencentes ao PCC.

Transações de Welber com empresas supostamente ligadas ao PCC | Tabela: Jornal Opção Tocantins

Ligação com o governador e sua família

Prints do inquérito da Polícia Federal | Jornal Opção Tocantins

O fio de ligação entre o governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) e de sua família apareceu por meio de depósitos realizados por Welber Guedes em favor deles. 

Considerado pelas investigações como um dos principais operadores do esquema, Welber Guedes recebia diretamente valores das empresas beneficiadas com a dispensa de licitação para a compra de cestas básicas.

Segundo o inquérito, Welber Guedes é apontado como suspeito de lavagem de dinheiro e teria recebido, por meio de duas empresas que tinham contrato com o governo, e uma outra utilizada no esquema, a quantia de R$10.677.799,00. O dinheiro teria sido repassado por intermédio de 249 transações bancárias, identificadas pela PF.

Welber Guedes fez depósitos, identificados nas transações bancárias apontadas no inquérito como “consórcio entre amigos”, tanto para o governador e seus filhos, quanto para o empresário Joseph Madeira, que possui contratos, recentemente renovados, com o governo do Estado e com a Assembleia Legislativa do Tocantins. O depósito no valor de R$5 mil para Wanderlei Barbosa foi feito no dia 3 de novembro de 2020. 

Welber Guedes também fez depósitos para Tiago da Silva Costa, secretário da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (Setas) na época das contratações para adquirir as cestas básicas.

Tiago da Silva Costa foi responsável pela contratação das duas empresas de propriedade de Welber Guedes que fizeram contratos com o Estado. O ex-secretário também aparece no inquérito tendo feito depósito no valor de R$10.700,00 para Joseph Madeira.

Jornal Opção Tocantins tentou entrar em contato com todos os envolvidos mencionados no texto, mas não obteve respostas, até a publicação da matéria. O espaço permanece aberto para suas manifestações.

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