Após 470 dias de guerra, enfim um acordo de cessar-fogo na Faixa de Gaza. Será mesmo?

A fase inicial que começou hoje, prevê a libertação de 33 reféns israelenses, classificados sob critérios humanitários. Neste primeiro grupo estão todas as militares em cativeiro, mulheres, homens com mais de 50 anos e os que estejam em estado crítico com menos de 50 anos.

Esta é a lista com os 33 nomes dos israelenses que deverão deixar o cativeiro nesta primeira fase do acordo: Romi Gonen, Emily Damari, Arbel Yehud, Doron Steinbacher, Shiri Bibas e seus filhos: Ariel e Kfir Bibas. Kfir é um bebê que completou no último dia 18, dois anos de idade. Liri Elbag, Karina Ariev, Agam Berger, Daniela Gilboa, Naama Levi. Ohad Ben Ami, Gadi Moses, Keith Siegel, Ofer Calderon, Eliyahu Sharabi, Itzik Elgart, Shlomo Mansour, Ohad Yahalomi, Yosef Elzayadna, Oded Lifshitz,Tzachi Idan. Yarden Bibas, Sagie Dekel Chen, Yair Horn, Omer Wenkert, Alexander Trofanov, Eliya Cohen, Or Levi, Tal Shoham e Omer Shem Tov. No entanto, ninguém sabe se eles estão vivos ou mortos.

Israel acredita que 25 dos 33 reféns estão vivos. Em troca,o governo israelense aprovou a a libertação de 734 prisioneiros palestinos acusados de terrorismo. Além disso, Israel se comprometeu a suspender a custódia de outro 1.167 palestinos que foram presos durante o conflito mas não tiveram a participação confirmada no massacre de 7 de outubro. Serão 1904 palestinos em troca de 33 israelenses. Os números incomodaram políticos do alto-escalão que compõem o Gabinete do Primeiro Ministro e que participaram das negociações. Muitos consideram exagerado a libertação de quase dois mil prisioneiros, entre eles há centenas de terroristas convictos, responsáveis por centenas de ataques.

Entretanto, o acordo foi respaldado pelo governo americano que está de saída. Em uma carta -documento, assinada pelo Presidente Joe Biden, caso o Hamas não cumpra os termos previstos para as próximas fases, Israel tem garantido o direito de reiniciar os ataques contra o grupo terrorista. O exército de Israel deverá permanecer dentro do território palestino pelos proximos 50 dias.

Acontece que acordos de cessar-fogo no Oriente Médio só tornam-se efetivos quando implementados, por isso, a probabilidade de ruptura, horas antes do ínicio, é bem maior do que a possibilidade de ser cumprido. Até porque trata-se de um acordo com um grupo terrorista. Foi justamente isso que ocorreu entre a tarde de sábado e a madrugada de domingo. 

Na manhã de sábado, ficou acordado que o Hamas deveria apresentar a lista com os nomes dos reféns israelenses que serão libertados às 16:30. Mas não foi o que aconteceu. Até o fechamento desse artigo, já eram quase duas horas da manhã em Israel e a lista não tinha sido apresentada. O grupo alegou questões técnicas para o atraso, porque estariam transferindo todos os reféns para um único lugar e que esse processo leva tempo porque a comunicação é realizada fisicamente, através de couriers. 

Além disso, o grupo alega que os bombardeios ininterruptos do exército impedem o deslocamento dos reféns para o local onde alegam ser seguro. A lista final ainda deveria passar pelo crivo do líder do Hamas, Mohammed Sinwar, e só então repassada às autoridades israelenses. Diante do não cumprimento dos termos iniciais, o governo de Israel deixou claro que somente com a apresentação da lista daria continuidade ao acordo e responsabilizou o Hamas pela interrupção.

No campo militar, as Forças de Defesa de Israel anunciaram que a partir das 08h30 da manhã deveriam iniciar a retirada das tropas, mas concluiu que a luta contra o Hamas não terminou e que deverá ser retomada num futuro próximo. Segundo o relatório dos militares, o Hamas não foi completamente desarmado e continua sendo uma ameaça que terá que ser enfrentada em breve, mesmo que os combates sejam realizados apenas por bombardeios aéreos. 

Caso a segunda fase do acordo não seja implementada, será necessário entrar novamente com as tropas na Faixa de Gaza. Batalhões inteiros deverão permanecer definitivamente numa “buffer zone” que vai funcionar como um trampolim para que novas operações possam ser efetuadas no enclave caso seja necessário. De acordo com os serviços de inteligência do país como Shabak e Mossad, será necessário — apesar do rastro de destruição  no território palestino após quinze meses de conflito, o grupo ainda conta com dezenas de quilômetros de túneis que ainda estão intactos e que garantem que os terroristas possam continuar, no subterrâneo, a produzir de armamentos além de do recrutamento e treianamento de novos membros. 

“Buffer zone” vai funcionar como um trampolim para que novas operações na faixa de Gaza | Foto: Reprodução

A falta de um objetivo final e a possibilidade de uma guerra de fricção permanente levou o país a questionar o acordo. Os israelenses consideram que a sobrevida dada ao Hamas pela libertação dos reféns é um mal necessário que vai cobrar da Nação um alto preço. A relutância em tomar decisões de peso e efetivas do governo e a apatia dos israelenses quanto ao conflito devido ao grande número de baixas,fizeram com que o exército diminuísse a marcha na Faixa de Gaza. Nos últimos meses os esforços de guerra se tornaram mínimos e o que se via no front era um exército que lutava em  círculos. As batalhas desafiadoras em Gaza ainda estão por vir.

Todos sabem que a interrupção deu-se após o presidente Donald Trump, que toma posse na segunda-feira, 20, colocou Netanyahu em xeque ao ameaçar fechar Embaixada dos Estados Unidos em Jerusalém caso o premier israelense não fechasse um acordo para encerrar o conflito. 

Sem saída, o líder israelense não teve opção senão encerrar as operações em Gaza que ficaram incompletas. Os militares planejavam novas e significantes invasões à Khan Yunis, a maior cidade do enclave, nos próximos seis meses. O local ainda conta com a presença terroristas experientes como Mohammed Shabaneh,que comanda a brigada de Rafah. O grupo ainda mantém o controle sobre uma área densamente populosa que se estende de Nuseirat a Deir al-Balah, que constitui um terço da Faixa de Gaza. Isso, sem contar áreas como Shijaiyah, Daraj-Tufah, Shati Camp, Sabra, Rimal e outras que sofreram ataques pesados durante meses e que depois foram abandonadas pelo exército ao considerar, erroneamente, esses locais como terra arrasada. A ausência dos militares possibilitou ao Hamas o reagrupamento entre as ruínas e o retorno de pelo cem mil pessoas à esses locais.

Enquanto o Gabinete do Governo, inexperiente em questões de segurança e sem pulso forte para tomar decisões políticas corajosas, preferiu manter o Exercito em Gaza demandando dos militares micro-táticas que acabaram por minar ações militares que poderiam ter enfraquecido ainda mais o Hamas. Enquanto os militares e os ministros tentam se esquivar da responsabilidade pelo vácuo se segurança que permitiu o Massacre de 07 de outubro, a portas fechadas os dois lados se engalfinham ao concluirem que, ao final, após quinze longos meses de guerra, Israel pode até ter enfraquecido o Hamas, mas não conseguiu alcançar nenhum objetivo concreto na Faixa de Gaza porque faltou diretriz. A missão acabou inconclusa. Uma falha imperdoável que pode custar a Netanyahu o fim do seu governo, liderança e carreira política. A sobrevivência do Hamas passa pelo fim da era Netanyahu.

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