Governo Federal e Coca-Cola formam aliança perigosa para as políticas de alimentação saudável

O governo federal tem sido alvo de críticas intensas pela manutenção de acordos com grandes corporações alimentícias, como a Coca-Cola, no programa “Acredita no Primeiro Passo”. A iniciativa, que prevê a criação de 200 cozinhas solidárias até 2026, está sendo questionada por especialistas em segurança alimentar, que apontam um possível conflito de interesses envolvendo a multinacional.

Isso ocorre principalmente devido ao papel da Coca-Cola na promoção de produtos ultraprocessados e bebidas açucaradas, associados ao aumento de doenças crônicas, como obesidade, diabetes e hipertensão. O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), órgão consultivo que assessora a Presidência da República, expressou preocupação com a parceria em uma recomendação enviada ao Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) em dezembro.

Segundo o Consea, o acordo vai contra as políticas públicas do Brasil de combate à fome e à má nutrição, além de enfraquecer as estratégias para promover uma alimentação saudável. O conselho alerta que a Coca-Cola, ao fazer parte dessa aliança, busca, na verdade, melhorar sua imagem sem alterar seus interesses comerciais, configurando o que especialistas chamam de “socialwashing” — uma estratégia de marketing disfarçada de responsabilidade social.

A crítica é reforçada pela postura da Coca-Cola e de outras empresas de ultraprocessados em relação às propostas de reforma tributária, como o aumento de impostos sobre produtos prejudiciais à saúde. A indústria tem se oposto a essas medidas, que visam desincentivar o consumo de alimentos ultraprocessados e incentivar a compra de alimentos mais saudáveis. O Consea defende que tais reformas são essenciais para combater a obesidade e outras formas de má nutrição e critica a aliança do governo com empresas que atuam contra essas mudanças.

Em resposta, o MDS justifica que as parcerias com empresas como a Coca-Cola e o McDonald’s têm como objetivo a redução das desigualdades sociais e a promoção de oportunidades de emprego para populações em situação de vulnerabilidade. Segundo o ministério, esses acordos não influenciam nas políticas de segurança alimentar ou nas escolhas nutricionais dos programas, mas buscam, sim, integrar práticas de capacitação profissional e inclusão social.

No entanto, especialistas como Inês Rugani, coordenadora do Observatório Brasileiro de Conflitos de Interesse em Alimentação e Nutrição (ObservaCOI), veem essas parcerias como uma tentativa das corporações de se apropriar de uma agenda socialmente positiva para melhorar sua imagem pública e ganhar legitimidade junto ao governo.

Acordo com operadora do McDonald’s

Além da Coca-Cola, o MDS firmou outro acordo controverso com a Arcos Dorados, operadora do McDonald’s, para a capacitação e inclusão de pessoas em situação de vulnerabilidade no mercado de trabalho. Embora o governo afirme que a parceria vai gerar milhares de empregos, críticas surgem sobre a real efetividade dessas ações, especialmente considerando o histórico da empresa em violações trabalhistas.

Em 2023, o Tribunal Superior do Trabalho condenou a Arcos Dorados por explorar trabalho infantil em suas franquias, fato que coloca em dúvida o compromisso da rede de fast-food com práticas trabalhistas justas.

Esses acordos entre o governo e gigantes da indústria alimentícia geram um dilema: ao se associar a empresas cujas práticas estão diretamente ligadas a problemas de saúde pública, o governo pode estar comprometendo a eficácia de suas políticas de segurança alimentar e seu compromisso com a saúde da população.

O cenário sugere uma relação perigosa entre a promoção de interesses corporativos e a implementação de políticas públicas voltadas para o bem-estar social. A falta de transparência nos processos e a ausência de um debate mais amplo sobre os impactos dessas parcerias deixam muitas perguntas sem respostas, levantando um alerta sobre a real intenção por trás dessas ações.

Em meio a essas discussões, especialistas defendem que, para realmente combater a fome e a má nutrição, o Brasil deve fortalecer suas políticas públicas com base em princípios sólidos de alimentação saudável e sustentável. Isso exigiria uma maior autonomia das políticas em relação à influência de empresas que, apesar de suas ações pontuais de filantropia, continuam a promover produtos prejudiciais à saúde pública.

A crítica ao governo é clara: é necessário garantir que a implementação de políticas sociais não seja distorcida por interesses corporativos, que podem comprometer os reais objetivos de inclusão social e bem-estar da população.

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