Divergência sobre depressão secundária gera debate entre especialistas no tratamento da doença

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que mais de 320 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de depressão, com maior prevalência após a pandemia de Covid-19. A doença caminha para se tornar a maior causa de incapacidade entre os trabalhadores de todo o mundo. No Brasil, ainda segundo a organização, mais de 11 milhões de pessoas enfrentam a condição, colocando o país como campeão no número de casos em toda a América Latina.

Com o advento da globalização, o mundo se conectou e questões que antes passavam despercebidas, ou que tinham menos atenção do que deveriam, começam a entrar nos holofotes. O problema é que agora não se tem tanto controle sobre o que é dito, então as informações se tornam incertas e podem acabar desinformando ao invés de informar. A depressão e a ansiedade, condições crescentes em nossa sociedade, são temas que se tornam cada vez mais recorrentes, portanto, é importante se certificar da validade do que é dito à respeito. 

A depressão secundária é uma expressão que vem se tornando cada vez mais recorrente nas redes digitais. A depressão secundária, segundo a OMS, se refere a quadros depressivos que surgem como consequência de outras doenças ou do uso de determinados medicamentos. Comumente, se refere à aparição de sintomas depressivos devido a uma condição anterior, como o hipotiroidismo e um acidente vascular cerebral, por exemplo. Essa categorização da doença não é tema pacificado entre pesquisadores e estudiosos. 

Psiquiatria

Tiago Oliveira, psiquiatra e gerente de saúde mental da Secretaria de Saúde de Goiânia (SMS), explica que a depressão, de forma geral, “são transtornos mentais que cursam com alteração de humor sem que você tenha uma alteração do organismo significativa causando isso”. Tristeza, falta de prazer, alteração de sono ou de apetite, mudanças nos níveis de concentração e de raciocínio são alguns dos possíveis sintomas. Nos casos mais graves, pode gerar agressividade e ideação suicida. 

Segundo o especialista, o tratamento de casos mais leves pode se restringir às mudanças de hábito e à psicoterapia, entretanto, casos mais moderados e graves necessitam de outros métodos. 

A eletroconvulsoterapia, estimulação magnética transcraniana, estimulação elétrica por corrente contínua, infusão de ketamina e neurocirurgia são alguns outros recursos apresentados por Tiago para casos mais graves. 

Foto: Foto: Renan Accioly / Jornal Opção.

Um ponto que gera divergência, segundo a avaliação do profissional, é em relação à origem da depressão. Ele explica que houve corrente de estudos que, baseada na ação dos antidepressivos, aponta uma causa biológica para o surgimento da doença. “Essa é uma hipótese que aumenta, mas que carece de uma comprovação científica”, afirmou. Segundo essa hipótese, uma baixa no funcionamento dos neurotransmissores causaria depressão, portanto, uma regulação química seria suficiente para agir sobre a depressão. “Isso gera muita confusão, porque as pessoas acham que é uma teoria já comprovada e, na verdade, é uma teoria que está sendo abandonada atualmente”, concluiu. 

O psiquiatra, entretanto, considera os efeitos físicos sobre o corpo nas possíveis causas da depressão, em alguns casos. Ele exemplifica dizendo que um hipotiroidismo severo pode trazer sintomas da depressão, e esse quadro depressivo “ melhora com o tratamento do hipotiroidismo”. Pensando na depressão secundária especificamente, que surge como consequência de uma condição anterior, é preciso tratar essa doença inicial antes de fechar qualquer diagnóstico psiquiátrico, garantiu Tiago. 

Psicologia 

Para Domenico Hur, psicólogo e professor de Psicologia da Universidade Federal de Goiás (UFG), no âmbito da Psicologia, muitas teorias discordam dessa divisão em tipos de depressão e muitos questionam também se a causa da depressão é apenas biológica ou neurológica. Para o especialista, o fator social não deve ser desassociado do biológico, a fim de oferecer um tratamento mais completo e eficiente aos pacientes. 

“Tanto a origem biológica da depressão quanto da loucura não são temas pacíficos nas diferentes correntes teóricas”, afirmou. Ele exemplifica dizendo que um paciente sem nenhum problema biológico em seus neurotransmissores ainda pode, devido à experiência social, podem desenvolver intensos quadros depressivos. 

Foto: Arquivo pessoal.

Para ele, as mudanças de hábito e o tratamento com psicoterapia devem ser as primeiras tentativas no combate à depressão, colocando a intervenção medicamentosa como último recurso. “A gente tem sempre que articular a depressão e o sofrimento como mal-estar político e não só como mal-estar individual”, concluiu. 

Neurologia

A neurocirurgiã Ana Moura reforça a possibilidade de doenças como Parkinson e hipotiroidismo, por exemplo, trazerem efeitos depressivos. Segundo a profissional, entre 40% e 50% da população que vive com Parkinson apresenta sinais depressivos. Pensando nos pacientes com epilepsia, essa margem gira em  torno dos 30% aos 50%. “Tratando a causa, a depressão melhora”, sintetizou. 

A neurocirurgia é posta como último recurso para tratamentos ligados à depressão. “Depois de tentar todos os tratamentos medicamentosos orais, injetáveis, eletroconvulsoterapia… e não funcionou, aí vem pra gente operar”, explicou. O procedimento é normalmente utilizado para tratar as doenças que puxaram a depressão secundária. 

Foto: Arquivo pessoal.

Entretanto, da mesma forma que Domenico, a especialista destaca o impacto do efeito social no tratamento desses pacientes. Em alguns casos, como em acidentes vasculares cerebrais, as sequelas são permanentes e a doença que puxou os efeitos depressivos não pode ser curada completamente. Nesses casos, comunidades terapêuticas, grupos de apoio e suporte familiar trazem melhora significativa na qualidade de vida dos pacientes. “A gente não pode abrir mão das medicações, mas devemos lembrar que o tratamento é um conjunto”, concluiu reforçando a importância do acolhimento.

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