Extrema direita opera para emplacar o cardeal Robert Sarah como papa

Rui Martins

Da Suíça

A morte do Papa Francisco, chefe da Igreja Católica com cerca de 1.4 bilhões de seguidores, espalhados por todos os países do planeta com predominância no Brasil, criou uma quase unanimidade de tema nas redes sociais, embora com interpretações diversas e mesmo antagônicas. Uma tal mobilização é rara ou mesmo inédita e merece ser documentada.

Na grande imprensa ocidental, uma vista de olhos mostra uma convergência, ressaltando os traços positivos de um Papa mais próximo dos fiéis católicos, sem uso da distância e ostentação de seus predecessores, disposto a abordar temas controversos e a não rejeitar quem não comungava da mesma fé. E sobretudo sua proximidade dos pobres, dos rejeitados e dos migrantes.

Na sua notícia necrológica, o jornal francês Le Monde acentua a personalidade complexa do Papa Francisco “que se mostrava progressista em certas questões, mas isso, segundo diversos editorialistas, escondia uma doutrina e gestão conservadoras… num pontificado marcado por uma vontade reformadora”. A sequência parece óbvia: “depois de Francisco está em questão a abertura da Igreja.”  Prestaram homenagem à memória de Francisco, o líder da extrema esquerda, Jean-Luc Mélenchon, a dirigente dos Verdes, Marine Tondelier e o socialista ex-president, maintenant député, François Hollande.

O jornal romano “La Republica”, citado por “Le Monde”,  se refere a João Paulo II, Benedito XVI e Francisco como formadores de um trio, no qual “Wojtyla era a alma, Ratzinger era o espírito, e Bergoglio era o coração”. Um Papa que se distanciou dos fastos para se aproximar “dos humildes, dos pequenos, dos fracos e dos “escravos”.

Essa visão é reforçada na revista de imprensa do jornal suíço Le Temps, precedida pelas inovações trazidas por Francisco para a Igreja Católica: primeiro Papa originário do Novo Mundo, primeiro jesuíta a dirigir a Igreja, primeiro Papa eleito enquanto seu antecessor (o alemão Ratzinger) ainda era vivo. Para o jornal suíço, Francisco se destacou por dar prioridade aos pobres, aos oprimidos e aos esquecidos.

Mas isso não evitou as críticas dos tradicionalistas contra sua abertura, e dos progressistas contra seu conservadorismo.

A extrema direita francesa detestava Francisco por se preocupar com os imigrantes que se afogavam no Mediterrâneo. Marine Le Pen criticava sua ingerência na política. Éric Zemmour disse que seu pontificado foi uma penitência para certos católicos e  Philippe de Villiers chama Francisco de “Papa woke” que “perseguia os cristãos da Igreja tradicional de nossa infância”.

A extrema direita tem um candidato para suceder Francisco: é o cardeal guineense Robert Sarah, de 76 anos, defensor conservador das tradições da Igreja e contra todo tipo de reformismo.

The Guardian e The New York Times acentuam sua preocupação pelas pessoas vítimas da guerra, dificuldades econômicas e pelas ameaças das mudanças climáticas. Francisco tentou ser o Papa da inclusão, da defesa das mulheres e da comunidade LGBT.

Nem tudo são elogios. O jornal espanhol El País, citado pelo jornal suíço Le Temps, critica a afirmativa “uma igreja pobre para os pobres”,lembrando que o Vaticano tem uma fortuna de 10 a 15 bilhões de dólares. E lembra que a frase em favor dos homossexuais “se uma pessoa é gay, quem sou eu para julgá-la?” foi resumida ao circular pela imprensa. Na verdade, ela era mais restritiva: “se uma pessoa é gay, procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?”

Mediapart, também citado, lembra posições reacionárias de Francisco sobre questões de gênero e aborto. E alguns jornais lembraram de notícias que circulavam na Internet, em 2013, desmentidas ou não, na época da eleição do arcebispo Bergoglio para ser Papa.

As mais antigas contavam ter sido Bergoglio o confessor do general Videla, tendo sido criticado por omissão e cumplicidade com a ditadura argentina, que governou o país de 1976 a 1983. Ainda durante essa ditadura, Bergoglio foi acusado de ter traído dois padres acusados de comunistas por realizarem trabalhos sociais, acusação sempre negada.

Papa Francisco nas redes sociais

Praticamente a maioria das redes sociais brasileiras comentaram a morte do Papa Francisco. Como vivemos numa democracia, muitos conservadores católicos, de outra religião ou sem religião utilizaram sua rede social para expressar sua opinião contrária ao Papa.

Destaque para a declaração do ex-presidente Bolsonaro, distribuída pelas redes bolsonaristas, na qual não cita o nome do Papa Francisco num texto anódino que, segundo opinião do jornalista Reinaldo Azevedo, no É da Coisa na Rádio Bandeirantes, não se parece com nada do que diz Bolsonaro. “Bolsonaro não cita o nome do Papa, em atenção à sua base política (os evangélicos, ver transcrição da fala de Azevedo)”.

O influenciador gaúcho Eduardo Bueno, conhecido também como Peninha, jornalista, professor, escritor e tradutor, tem um estilo muito especial na apresentação de seus vídeos, tanto no youtube como no instagram. No vídeo que selecionamos, Peninha, pergunta se os que estavam torcendo pela morte do Papa Francisco, vão fazer alguma publicação nos seus canais.

E, assim, ficamos sabendo que certos influencers católicos conservadores e não católicos torciam pela morte do Papa, tendo havido vídeos comemorando quando isso ocorreu. É o caso da vereadora Mariana Lescano, em Porto Alegre, para quem a morte do Papa tem o valor de uma “limpeza espiritual”.

O professor Daniel Gontijo procurou ter mais informações e selecionou alguns canais entre as dezenas mostradas pelo Youtube. Vale a pena abrir seu vídeo (https://www.youtube.com/watch?v=yTN7jnt2ml0).

Rui Martins, jornalista, mora na Suíça.

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