Como o contrabando de cigarros falsificados rompeu o mundo físico e se instalou nas plataformas digitais

O contrabando de cigarros falsificados, produzidos principalmente no Paraguai,  rompeu não só as barreiras físicas, como também as digitais. Os produtos nocivos à saúde e que são expressamente proibidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) são anunciados e vendidos aos montes em grupos de WhatsApp, Facebook e Telegram, numa espécie de tabacaria cibernética. 

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Por duas semanas, o Jornal Opção se infiltrou no submundo do contrabando, acompanhando e negociando com criminosos, a fim de mostrar a ousadia dos responsáveis por uma das mais rentáveis atividades ilegais do mundo. Para se ter uma ideia, o contrabando de cigarros fez com que o Brasil, nos últimos 11 anos, deixasse de arrecadar R$ 94,4 bilhões, conforme pesquisa do Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP) divulgada em 2023.

Os produtos são comercializados no espaço virtual, que reúne traficantes, contrabandistas e até criminosos faccionados, onde tudo é “legalizado”. São inúmeros anúncios de marcas de cigarros, que segundo os criminosos, são nacionais e importados. Os internacionais, de origem paraguaia, chegam a valer 50% a menos do que os brasileiros.

Os produtos são enviados para todo o País, por meio de caminhões e até pelos Correios, sendo que alguns afirmam arcar com o frete para “ganhar o cliente”. Os cigarros são rastreados pelos próprios vendedores e compradores desde o momento que são despachadas até a chegada no destino final.

“Venda fácil”

Organizados, alguns “comerciantes”, com o auxílio de tabelas de preços, anunciam o preço dos produtos nas plataformas digitais. Os valores variam de marca para marca, com caixas de 50 pacotes custando entre R$ 700 (marca Zen) e R$ 950 (marca Egipt ou Eight).

Se passando por um cliente, o repórter simulou uma compra de R$ 18 mil com um dos vendedores identificado como Carlos Rodrigo. Ao todo, foram encomendadas 10 caixas da marca Fox, sete da marca R7 e sete da marca Hills. O contrabandista, de Itapirapuã (MT), na divisa com o Paraguai justifica o preço:

“Não dou três dias para fazer R$ 30 mil com essa mercadoria. Fechando o pacote hoje, te entrego em até três dias. Pode ficar sossegado que eu posso até indicar lugares que você pode vender. Vamos fechar a parceria e ganhar dinheiro juntos. Só me passa seu endereço e o nome completo que vou falar com os meus contatos da PRF e da Receita Federal que tenho um menino ai e que não é pra mexer com ele ”, disse, por telefone, o criminoso após ser questionado sobre a segurança do transporte.

Para fechar o negócio, o repórter precisaria preencher uma ficha com informações pessoais e de endereço. Sentindo que a venda não iria ser realizada, Carlos chegou a mandar vídeos de supostos clientes. Um dos homens, que se apresentou como “Dudu”, afirmou que compra cigarros do contrabandista há anos e que tem facilidade em revendê-los em depósitos. 

“Dudu” ainda indica Carlos que, segundo ele, “trabalha com produtos de qualidade e têm responsabilidade”. Ele ainda conta que as entregas são pontuais e que nunca teve problemas com o criminoso.

“Comprem, pessoal. Podem confiar, não deixem de comprar. No começo, quando comecei a negociar com ele, fiquei meio desconfiado. Os preços são bons e chega tudo em dia. Desejo a todos sucesso e um bom negócio”, concluiu. 

Combate milionário 

Em Goiás, o combate ao contrabando é realizado tanto pelas forças de segurança estaduais quanto federais. Em 2023, apenas a Polícia Rodoviária Federal (PRF), apreendeu 3 maços de cigarros contrabandeados por dia. Ou seja, uma média mensal de 91 por mês, totalizando mais de 1,1 mil no ano. Convertido em valores, as apreensões chegaram a quase R$ 9 milhões no decorrer do ano.

Nesta quarta-feira, 7, por exemplo, a corporação em conjunto com a Polícia Militar (PM) abordou e prendeu um contrabandista na posse de mais de 127 mil maços de cigarros oriundos do Paraguai. A mercadoria avaliada em mais de R$ 1 milhão foi encaminhada à Receita Federal. 

“O estado tem uma importância logística para os criminosos, que usam as rodovias para distribuir drogas e produtos contrabandeados para todo o país. Ele só fica atrás do Mato Grosso do Sul e do Paraná, que são estados fronteiristas”, explicou o inspetor da PRF, Newton Morais.

Newton explicou que, devido a forte atuação integrada entre as forças de segurança no estado, os criminosos optaram por evitar as estradas goianas. No entanto, o fluxo de produtos que entram pela fronteira e são apreendidos em Goiás é grande, principalmente nas BRs 153, 060 e 364.

“Esses produtos, que são doados ou leiloados pela Receita Federal devido ao risco que apresentam, são destruídos. Não faz sentido manter algo que não pode ser reaproveitado”, concluiu.

Apreensão de cigarros realizada pela PM em conjunto com a PRF | Vídeo: Reprodução

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