Bob Marley nunca foi ‘apenas’ um pacifista!

Por Cynthia Pastor (editora do jornal Opção Entorno)

O filme biográfico em cartaz nos cinemas do país: “One Love”, dirigido por Reinaldo Marcus Green e estrelado por Kingsley Ben-Adir nos mostra um pouco da grande jornada que está por trás da música revolucionária deste profundo rastafári, que foi Bob Marley.

A ideia de que Marley foi um grande “mensageiro do amor” e a sua condecoração pela ONU com a “Medalha da Paz do Terceiro Mundo”, são apenas cenários simpáticos que ocultam os violentos atos da colonização europeia na Jamaica, a miséria daquele país e as questões políticas vividas por seu povo. Bob usou, sim, sua música para abordar questões políticas e sociais, em busca de igualdade e deu voz à sua luta pessoal pelos direitos civis.  “Get Up, Stand Up” é um clássico hino que propõem que os oprimidos se levantem e lutem por seus direitos.

Robert Nesta Marley nasceu em Saint Ann, zona rural jamaicana, fllho de uma jovem camponesa com um capitão branco do exército inglês. Durante sua infância ele ouviu falar pela primeira vez sobre o imperador etíope Haile Selássie,  considerado uma divindade pela religião rastafári, que ele adotou mais tarde em sua juventude e que sempre foi importante na estruturação de seus conceitos políticos, somados à doutrina pan africanista, defendida entre os descendentes dos africanos escravizados que foram levados para a América no século XIX.

Após a morte do pai, em 1955, Bob e sua mãe foram morar na periferia, na comunidade de Kingston. Longe do conforto que o campo lhe proporcionava, o jovem Marley entende as agruras da pobreza de um país colonialista que só veio a se tornar independente em 1962. Vale destacar que, durante os anos 1970, os Estados Unidos promoveram intervenções políticas e a militarização através do financiamento de gangues armadas no país. Ali, em Trenchtown, com este cenário bélico, Bob passa a sentir na pele o que é a violência, o racismo e a chegada da religião em sua vida como uma espécie de redenção.

Foi a experiência em Trenchtown que de, certo modo, moldou sua consciência. As letras que denunciavam exatamente a violência e a desigualdade são oriundas desse período. Posteriormente, já conhecido mundialmente e bem produzido pelos marqueteiros do rico mercado fonográfico, Marley é tido como aquele que professa a fé rastafári com o uso religioso concomitante de cânhamo e a busca da paz mundial. Contudo, o filme não mostra quase nada da revolução intrínseca dentro deste tal discurso considerado “pacifista”.

É nesse ponto do filme que o roteiro tem tropeços que mereciam ser realmente burilados e acaba por ter um recorte superficial, principalmente no teor político e nas causas que Bob defendia. As questões mais fundamentais do movimento rastafári e a luta pela paz na Jamaica não são abordadas de forma mais profunda, a exemplo de filmes fortes no “deep dive” como Malcolm X (do grande Spike Lee); Marighella (de Wagner Moura) ou Bird (biografia de Charles “BIRD” Parker, dirigido pelo icônico Clint Eastwood), onde a intelectualidade orgânica, a personalidade política legitimada e a construção do mito são muito bem enfatizadas.

Tudo isso tornaria o filme mais impactante na composição das cenas. Porém, há que se destacar entre os pontos marcantes, o atentado que Bob e Rita (mãe de quatro de seus doze filhos e sua companheira até o fim) sofrem, assim como o seu período produtivo durante o exílio consentido, em Londres, que garante uma trilha sonora impecável, com as músicas mais icônicas do músico jamaicano.

Na contramão de sua luta política, a coletânea Legend, lançada após seu falecimento, foi o álbum de reggae mais vendido da história. O grande rastafári morreu em 11 de maio de 1981, aos 36 anos, vítima de um câncer que ele nunca quis tratar. A revolução, de fato, começa dentro de si!

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