Filme Ainda Estou Aqui cria uma organização guerrilheira que não existia em 1971

O filme “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, informa que, entre as décadas de 1960 e 1970, havia uma organização guerrilheira de nome Aliança Libertadora Nacional. Trata-se de um erro frequente, sem gravidade, claro.

Na verdade, a organização criada por Carlos Marighela e Joaquim Câmara Ferreira — e talvez a mais importante da guerrilha, ao lado da VPR — era a Ação Libertadora Nacional.

A ALN como sugere o nome — começando com Ação — não era uma “aliança”. Comunistas que saíram do Partido Comunista Brasileiro somados a líderes estudantis se agruparam na ALN para tentar derrubar a ditadura. Era um grupo coeso, guerrilheiro. Sem nuances.

A razão da confusão é que, entre 1934 e 1937 (início do Estado Novo), existiu uma Aliança Nacional Libertadora (ANL), que, como sugere o nome, era uma frente política que agregava de democratas a comunistas como Luiz Carlos Prestes. Era anti-imperialista, antifascista e anti-integralista (o integralismo era dirigido por Plínio Salgado, que se pretendia o Mussolini patropi).

Eunice Paiva e Rubens Paiva: vítimas do cruento governo de Emilio Médici | Foto: Arquivo da família

O erro, que não tem nenhuma relevância, não empana o brilho do filme, que é muito bem-feito. Walter Moreira prova mais uma vez que não são apenas os argentinos que sabem fazer filmes adultos — sérios — sobre a história do Brasil (“Memórias do Cárcere” é outro belo filme sobre a perseguição das esquerdas e dos democratas na década de 1930, mas não é qualquer dia que surge um Nelson Pereira dos Santos).

Fernanda Torres, personificando Eunice Paiva — mulher de Rubens Paiva, que, mesmo não sendo comunista ou guerrilheiro, foi assassinado pelos hunos do Exército, em 1971 —, segura o filme, por assim dizer. Ela é o filme. E, assim, firma a história.

O sucesso do filme é que, embora tenha lado, o da esquerda, não faz discurso engagé. Pelo contrário, mais mostra do que demonstra. Faz a radiografia da ditadura a partir da radiografia de uma família que, feliz, se tornou trágica a partir da ação bárbara da ditadura civil-militar.

Walter Salles, tendo como base o livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva, filho de Rubens e Eunice Paiva, recupera a década de 1970, em seus inícios, e cria literatura (histórica) com imagens e falas. Eis um filme doloroso, mas, ainda assim, belo. Significativo. Os argentinos ficarão com inveja, quem sabe.

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