Jornalismo “telepático” do Curta Mais fala de uma Nova Veneza que é ficcional

O site “Curta Mais” publica reportagens qualificadas sobre restaurantes, hotéis, refúgios turísticos e as indefectíveis listas (algumas delas derivadas de uma “agência” — a “Revista Bula”, a excelente publicação cultural editada pelo bardo Carlos Willian Leite).

Porém, na quarta-feira, 3, o “Curta Mais”, editado pelo competente Marcelo Albuquerque (cuja publicação é copiada por um jornal quase secular), pisou na bola, no tomate e no macarrão. A reportagem “Conheça a Veneza do Cerrado que guarda tradição, hospitalidade e boa comida” teria sido feita por “telepatia”? O repórter realmente esteve na cidade? Teria usado lentes “coloridas” pelo jornalismo-Poliana?

Primeiro, apesar do nome, Nova Veneza nada tem a ver com a Veneza italiana. São totalmente diferentes.

Segundo, “boa parte” — o que será que significa isto? — dos moradores de Nova Veneza é realmente de origem italiana? Talvez não. Talvez cada vez menos. Seria mais adequado, em nome da precisão, sugerir que uma pequena parte é de origem italiana. A valorosa família Stival, por exemplo.

Terceiro, a primeira palavra do texto, “Exatamente!”, com exclamação e tudo, seria um método do novo jornalismo que se faz, não no Brasil, e sim em Goiás? Textos exclamativos são, no geral, “amigos” de “reportagens” pagas — o que, claro, não é o caso da matéria do “Curta Mais” (site que, insisto, não é ruim; pelo contrário, é bom, porque é, em regra, bem-informado).

Trecho de reportagem do site “Curta Mais” | Foto: Jornal Opção

Quarto, o povo é, de fato “hospitaleiro”, como diz o “Curta Mais”.  Mas e quanto “os sabores irresistíveis da boa comida”? Será que se trata de jornalismo “telepático”? Será que o repórter realmente visitou a cidade fora do período do Festival Italiano de Nova Veneza? O deste ano, informa o site, acontecerá entre os dias 20 e 23 de julho. Sim, no festival, muito concorrido, a comida é bem-feita, com relativa variedade.

Ao contrário do repórter do “Curta Mais”, eu e minha mulher, Candice Marques de Lima, estivemos em Nova Veneza, num domingo, e procuramos restaurantes italianos — ou um restaurante comum. Trata-se de uma missão impossível. Tanto que a reportagem do site, apesar de falar da excelência da comida, não cita nenhum restaurante. Sim, frise-se, nenhum.

Então, a boa comida de Nova Veneza, pelo visto, só não é ficção quando acontece o festival. Estive lá, na companhia de Danin Júnior, Ecilene Camargo e Candice Marques de Lima, e pude comprovar que a comida é, na média, de qualidade. Mas insisto que, fora do período do festival, não há nenhuma excelência na comida de Nova Veneza. Aliás, é difícil até mesmo encontrar um restaurante aberto aos domingos.

Nova Veneza é apresentada como uma cidade turística pelo “Curta Mais”. Talvez seja, até pelo belo nome, mas, em termos de alimentação, deixa a desejar.

O “Curta Mais”, mais entusiasmado do que o prefeito do município, escreve: “Essa forte influência cultural italiana na região pode ser percebida através de ruas pitorescas, da arquitetura de casas coloridas, dos festivais culturais, das tradições familiares e da vibrante vida comunitária presente na cidade”.

Mesmo com a maior vontade, tenho de perguntar: o jornalista que escreveu a reportagem esteve em Nova Veneza ou em Veneza? O que o repórter viu talvez poucas pessoas tenham now how para ver. Talvez precisem de um telescópio.

De maneira exagerada, o repórter assinala: “Os moradores locais recebem os visitantes de braços abertos, prontos para compartilhar suas histórias e tradições”. Cá entre nós, caro Marcelo Albuquerque, será que seu repórter está mesmo falando de Nova Veneza? O povo da cidade realmente é educado e prestativo, mas não vi ninguém recebendo turistas de braços abertos. O povo da cidade é sério e trabalhador — não faz parte de nenhuma comédia.

Por fim, logo no primeiro parágrafo, o entusiasmado repórter, depois de duas exclamações, fala da “origem italina” de parte dos moradores de Nova Veneza. Talvez, dada a carência de comida, tenha decidido “comer” um “a”. Teria sido melhor devorar um sanduba numa das pracinhas da cidade.

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