As dores de Pedro Ludovico e Ary Valadão: a morte de dois filhos

Um pai e uma mãe enterrarem um filho é inverter a lógica da vida. São os filhos que fecham os olhos dos seus pais e não o contrário. Não importa se é rico ou pobre, famoso ou anônimo. A dor da perda é incomparável, praticamente não existem palavras para descrevê-la. Pedro Ludovico e Ary Valadão perderam seus filhos em acidentes aéreos. Ambos eram governadores de Goiás quando sentiram essa dor terrível. Nenhuma derrota política se compara a essa perda. Por causa da violência do acidente, não era recomendável fazer um velório com o caixão aberto. Pedro e Ary não puderam ver os filhos pela última vez para a última despedida.

Em 1952, Antônio Borges Teixeira, filho do fundador de Goiânia, morreu em um acidente de avião quando viajava de Rio Verde para a capital. Pedro Ludovico ficou desolado ao saber da notícia. O revolucionário de 1930, o homem que transferiu a capital goiana, desmoronou ao ver o caixão do seu filho. O semblante abatido e a necessidade de ser amparado pelos amigos demonstraram o golpe que aquela perda aplicou em sua alma. Bem que Pedro tentou se manter firme durante o enterro de Antônio no Cemitério Santana, em Goiânia, mas a dor era tanta que ele sofreu uma vertigem e teve que ser levado para casa.

Ary Valadão foi o último governador goiano indicado pela Presidência da República no final da ditadura civil-militar. Seu filho Ary Valadão Filho o acompanhava em eventos públicos e dava a impressão de que o sucederia na política. Em 1981, Aryzinho, como era conhecido, embarcou em um avião e viajou até Alto Paraíso para acompanhar um projeto que o governo estava implantando na região. A aeronave caiu antes de chegar ao seu destino. O piloto morreu e outros três passageiros foram resgatados com vida, entre eles, Aryzinho. As vítimas foram levadas para o Hospital de Queimaduras em Goiânia. A situação era grave. Ary Valadão Filho morreu no dia 13 de novembro de 1981 — há 42 anos. Seu velório aconteceu no dia seguinte, data do aniversário do seu pai. Quer dor pior para um pai do que enterrar seu filho no dia que ele deveria celebrar a vida?

As fotos destes momentos terríveis na vida de dois governadores de Goiás não precisam de legenda. Apesar do homem público ter mais abraços do que um homem simples, não há abraço que preencha o vazio no coração de um pai ao enterrar um filho. Quando isso acontece com um governador, não há crítica ou acusação da oposição que doa tanto quanto essa perda irreparável.

A um ausente

Carlos Drummond de Andrade

Tenho razão de sentir saudade,

tenho razão de te acusar.

Houve um pacto implícito que rompeste

e sem te despedires foste embora.

Detonaste o pacto.

Detonaste a vida geral, a comum aquiescência

de viver e explorar os rumos de obscuridade

sem prazo sem consulta sem provocação

até o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.

Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.

Que poderias ter feito de mais grave

do que o ato sem continuação, o ato em si,

o ato que não ousamos nem sabemos ousar

porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,

de nossa convivência em falas camaradas,

simples apertar de mãos, nem isso, voz

modulando sílabas conhecidas e banais

que eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.

Sim, acuso-te porque fizeste

o não previsto nas leis da amizade e da natureza

nem nos deixaste sequer o direito de indagar

porque o fizeste, porque te foste.

(Do livro “Farewell”, Editora Record)

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