Funcionários denunciam assédio moral nos Conselhos de Psicologia

Funcionários de Conselhos Regionais de Psicologia de diversos estados fizeram uma manifestação no último sábado, 25, em Brasília, denunciando assédio moral sistemático e outras formas de violências psicológicas que ocorrem dentro dos órgãos. Um ofício foi entregue ao presidente do Conselho Federal de Psicologia, cobrando ações contundentes contra tais práticas. Os manifestantes também entregaram uma coroa de flores representando o luto e “silêncio pela morte da ética profissional de alguns conselheiros regionais”. 

Uma psicóloga, sob condição de anonimato, explicou que está no Conselho desde 2012 e que em todas as gestões sofreu alguma situação de assédio. “A maioria das denúncias foram reportadas às gerências. Eram situações com conselheiros que tinham relações conflituosas com outras pessoas também. Mas na última gestão, de 2019 a 2022, sofri bastante assédio, dirigido diretamente a mim, e precisei de tratamento psiquiátrico”, relatou ao Jornal Opção

Apesar de reportar as situações, nunca houve uma política institucional para mitigar o assédio contra os funcionários. Algumas gestões tomaram ações pontuais, como retomar os conselheiros que praticavam assédio e outras não fizeram nada e foram omissas com as violências. 

A atual gestão do CFP está sob presidência de Pedro Paulo Bicalho, que sucedeu Ana Sandra Fernandes Arcoverde Nóbrega. Recentemente, a Vice-Presidenta do Conselho Federal, Ivani Francisco de Oliveira, foi afastada de suas funções. “O Pedro, diante de várias denúncias, não teve opção e expulsou ela da diretoria e do plenário, alegando afastamento”, denunciou um servidor do Conselho Federal de Psicologia. 

“Não tenho informações sobre o afastamento da vice-presidenta, além de que foi por questões políticas”, relatou outra denúncia anônima. Ivani é ex-presidente do CRP de São Paulo, que já fez greve e denúncias contra os abusos. Há uma página no instagram criada para o envio de denúncias contra o CRP-SP, onde constam relatos relacionados a assédio e questões orçamentárias. 

“A auditoria do Conselho Federal de Psicologia trouxe 17 achados no CRP-SP e revela diversas ações irregulares e equivocadas por parte dos gestores da instituição. Contratações sem os devidos processos legais, licitações inadequadas, auséncia de controles em fase de pagamentos, relatórios contábeis imprecisos, falta de acordo coletivo de trabalho que ocasionou ruptura entre diretoria e trabalhadores, além de uma clima organizacional desfavoråvel”, denuncia uma publicação do perfil.

Um servidor que trabalhava no Conselho Regional de Psicologia da 9ª Região – Goiás (CRP09) também relatou assédio moral e acúmulo de funções. “Eu cuidava sozinho do setor inteiro e diversas vezes falei para a diretoria que estava esgotado com a carga de trabalho. Eu sugeri que eles deveriam contratar uma pessoa a mais ou diminuir as demandas, mas elas só aumentavam” relatou o ex-funcionário, que optou por não ser identificado.

“As pessoas choravam no ambiente de trabalho”

Esse ex-funcionário relatou ainda que o ambiente de trabalho era tão ruim e que os colegas estavam tão esgotados a ponto de chorar no ambiente de trabalho. De acordo com ele, a carga horária era muito pesada e isso o adoeceu, tendo que se afastar para licença psiquiátrica. “Eu não era o único doente ali, haviam diversas pessoas esgotadas e os psicólogos simplesmente ignorando, querendo só entregas”, relembrou. Segundo o relato, os psicólogos “queriam o conselho bombando entre a categoria” e para isso “sugavam toda a energia dos funcionários”.

Antes de se afastar por Síndrome de Burnout, esse ex-funcionário conta que praticamente implorou por ajuda, mas foi ignorado em todas as oportunidades. De todos os lugares para se ter um episódio de Burnout, ele relata que o Conselho de Psicologia era o menos provável, mas que se surpreendeu com o ambiente psicologicamente tóxico.

Por fim, quando não aguentou mais, após anos de alerta, ele teve um quadro grave de esgotamento, travou totalmente e entrou em um quadro de depressão profunda. Focu três meses em afastamento psquiátrico, passou pela perícia do INSS que comprovou o adoecimento, e retornou ao trabalho posteriormente com o fim do atestado. Ao voltar, foi demitido no mesmo dia.

“A hipocrisia maior é que por diversas vezes eu pedi para eles contratarem alguém para me ajudar porque seria um alívio muito grande ter uma outra pessoa. No entanto, um mês depois que eu fui demitido, foi criado um novo cargo dentro do meu setor”, conta o profissional.

Procurado pelo Jornal Opção, o Conselho Regional de Psicologia da 9ª Região – Goiás (CRP09) informa que, em relação ao documento entregue ao presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), aguardará a manifestação do o órgão federal. Quanto aos supostos relatos no âmbito da atuação do CRP09, informa que até agora nada foi oficializado.

O Conselho em Goiás é presidido pelo Conselheiro-Presidente Wadson Arantes Gama, Pré-candidato a vereador pelo PSB.

Ofício entregue ao Conselho Federal

“Somos violentadas(os) diariamente, principalmente por meio de violência psicológica, justamente por aquelas(es) que deveriam combater todas as formas de negligência, discriminação,  exploração, violência, crueldade e opressão (princípio fundamental II do Código de Ética Profissional da/o Psicóloga/o). Aparentemente, as(os) conselheiras(os) se esqueceram que são psicólogas(os) e que devem seguir, rigorosamente, o Código de Ética da profissão no seu exercício funcional”, diz trecho do ofício, assinado por Gustavo de Freitas Barbosa, Secretário-Geral do Sindicato dos Empregados Em Conselhos e Ordens de Fiscalização Profissional e Entidades Coligadas e Afins do Distrito Federal (SINDECOF-DF)

“Infelizmente o Sistema Conselhos virou um lugar de vaidades, que sobressaem aos interesses coletivos”, relatou uma psicóloga. De acordo com o Código de Ética da profissão, o psicólogo considerará as relações de poder nos contextos em que atua e os impactos dessas relações sobre as suas atividades profissionais, posicionando-se de forma crítica e em consonância com os demais princípios do Código.

“Quando as(os) representantes da profissão comportam-se de maneira hipócrita, ignorando seu próprio código e sua ciência, a própria profissão é hipócrita e acaba por perder o respeito da sociedade. E não sejamos inocentes: não há campanha de valorização profissional que dê conta de desfazer a desvalorização que o próprio Conselho cria, afinal, uma ação vale mais que mil postagens no Instagram”, continua o documento.

Para o ofício, é desnecessário pontuar para profissionais da Psicologia o impacto que essas violências psicológicas têm na vida das(os) trabalhadoras(es) que convivem no ambiente tóxico dos Conselhos de Psicologia. 

“Muitas(os) de nós vivemos à base de tratamentos psicológicos e psiquiátricos para minimizar os sintomas do adoecimento decorrente das ações e relações vivenciadas no trabalho: ansiedade, depressão, burnout, crises de pânico, entre outras. Aquelas(es) que ousam enfrentar o assédio e apontar a incoerência entre o discurso e as práticas das gestões tornam-se alvo de mais assédio, perseguições, humilhações, ameaças e até de processos administrativos motivados exclusivamente por um desejo pessoal da(o) conselheira(o) ou gestora(or) de punir a(o) trabalhadora(or)”, denuncia o Sindicato dos Empregados Em Conselhos e Ordens de Fiscalização Profissional e Entidades Coligadas e Afins.

Trecho do documento entregue ao Conselho Federal de Psicologia | Foto: Arquivo

De acordo com o Sindecof-DF, o CFP já pautou o assunto para a próxima plenária. O Sindicato está à frente da organização de todos os entes regionais (APAF – Assembleia de Políticas, da Administração e das Finanças), encabeçando a luta e unificando todo o corpo funcional dos Sistema Conselhos de Psicologia.

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