Conheça o metal raro e necessário para o seu celular, e que virou alvo de guerra na África

Dentro do seu celular, é provável que exista uma pequena quantidade de tântalo, um metal raro que, atualmente, se encontra no epicentro de um violento conflito na República Democrática do Congo (RDC). Esse metal é fundamental para o funcionamento dos smartphones e de outros dispositivos eletrônicos, e sua extração está frequentemente ligada ao grupo rebelde M23, que tem se destacado na mídia global.

Com um peso inferior a uma ervilha, o tântalo é crucial para os capacitores que armazenam energia em aparelhos eletrônicos. Suas propriedades, como alta resistência à corrosão e capacidade de armazenar carga em um espaço reduzido, fazem dele um material indispensável na indústria eletrônica.

Embora também seja extraído em países como Ruanda, Brasil e Nigéria, cerca de 40% da oferta mundial vem da República Democrática do Congo, onde muitas minas estão sob controle do M23.

O M23, composto principalmente por membros da etnia tutsi, emergiu após o genocídio em Ruanda em 1994. O grupo alega que sua luta é pelos direitos dessa minoria, mas sua expansão territorial se tornou uma fonte de receita através da exploração mineral. Recentemente, o M23 ganhou notoriedade com o ataque a Goma em fevereiro, resultando em uma onda de violência que deixou milhares de mortos e um ambiente caótico.

O ataque a Goma, um importante centro comercial e de transporte, simboliza a escalada do conflito. A cidade, com uma população de aproximadamente um milhão de habitantes, tornou-se um foco de luta entre o M23 e as forças governamentais, criando um cenário de horror. Os confrontos resultaram em mortes, desastres humanitários e uma fuga em massa de prisioneiros, exacerbando a crise humanitária na região.

Relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU) documentam atrocidades, incluindo violência sexual em larga escala, onde mais de 100 mulheres foram estupradas durante a tomada de uma prisão. Esse tipo de violência é comum em conflitos armados e ilustra a brutalidade da situação enfrentada pela população civil.

Além de dominar as minas, o M23 estabeleceu um sistema de controle sobre a extração do coltan, o minério do qual o tântalo é extraído. De acordo com um relatório da ONU, o grupo impõe taxas sobre mineradores e comerciantes, aumentando os salários dos trabalhadores para garantir a continuidade da produção. Estima-se que o M23 arrecade cerca de US$ 800 mil mensais através da exploração do coltan em Rubaya.

A mineração informal na região envolve milhares de trabalhadores que operam em condições perigosas, extraindo e processando o minério manualmente. Essa rede complexa levanta questões sobre como o coltan extraído nas áreas sob controle do M23 é integrado ao mercado global.

Embora haja grandes conglomerados mineradores, muitas minas permanecem nas mãos de operadoras locais e informais, que muitas vezes enfrentam uma luta constante pela sobrevivência e segurança.

Iniciativas de rastreabilidade, como a Iniciativa Internacional da Cadeia de Suprimentos de Estanho (ITSCI), foram criadas para assegurar que os minerais utilizados em eletrônicos sejam obtidos de forma responsável. Contudo, a eficácia dessas iniciativas é frequentemente comprometida por corrupção e pela dificuldade de supervisão em áreas remotas.

A ITSCI, que supostamente cobre milhares de minas na região, tem sido alvo de críticas por sua capacidade de garantir a origem dos minerais. Em Rubaya, após a tomada do M23, a ITSCI suspendeu suas operações, mas o grupo conseguiu continuar exportando coltan via Ruanda. Especialistas da ONU afirmam que o minério extraído sem certificação se mistura à produção legal de Ruanda, criando um cenário confuso sobre a origem dos materiais.

Aumento das Exportações

Nos últimos anos, as exportações de coltan de Ruanda aumentaram significativamente, levantando dúvidas sobre a verdadeira origem do minério. Dados do Serviço Geológico dos EUA revelam que as exportações de coltan de Ruanda aumentaram em 50% entre 2022 e 2023. Apesar das alegações do governo ruandense de que possui capacidade de refino, especialistas indicam que não é viável que toda essa quantidade provenha de suas próprias minas.

A porta-voz do governo de Ruanda, Yolande Makolo, defendeu que a sua nação tem os recursos e a infraestrutura para o processamento de minerais, desafiando os críticos a considerar o contexto de uma comunidade perseguida lutando por seus direitos. O presidente Paul Kagame também refutou as alegações dos especialistas da ONU, questionando sua credibilidade.

A complexidade da situação levou o governo congolês a processar subsidiárias da Apple em tribunais europeus, acusando-as de usar “minerais de conflito”. Em resposta, a Apple afirmou que, devido à escalada do conflito e dificuldades de certificação, interrompeu a compra de tântalo da região.

No entanto, outras empresas não foram tão transparentes em suas práticas de abastecimento, levando a questões éticas sobre o impacto de suas operações em áreas de conflito. À medida que o M23 conquista mais território, há uma preocupação crescente de que esses pequenos fragmentos de tântalo extraídos possam continuar a ser utilizados em dispositivos eletrônicos que dependemos diariamente.

O tântalo, essencial para a tecnologia moderna, revela a interligação entre a indústria de smartphones e os conflitos armados na África. O dilema ético enfrenta não apenas os consumidores, mas também as empresas que se beneficiam de uma cadeia de suprimentos complexa e opaca.

À medida que a situação se deteriora, o desafio é assegurar que os dispositivos que usamos não sejam alimentados por uma rede de violência e exploração. Com a crescente demanda por tecnologias, é fundamental que os consumidores e as empresas adotem uma abordagem mais responsável e informada sobre a origem dos materiais que compõem nossos aparelhos eletrônicos.

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