Fernando Gasparian, criador do Opinião (“pai” do Jornal Opção), vai ganhar biografia

O jornalista, economista e empresário Herbert de Moraes Ribeiro admirava o engenheiro, empresário e político Fernando Gasparian (1930-2006). Tanto como empreendedor quanto pela coragem de, em plena vigência do AI-5 — quando a ditadura civil-militar roçou o totalitarismo, e não apenas o autoritarismo —, ter criado o jornal “Opinião”. Em 1972. Tempos difíceis do cruento governo do ditador-presidente Emilio Garrastazu Médici.

Três anos depois, no governo do general-presidente Ernesto Geisel, Herbert de Moraes Ribeiro criou (com o apoio de Nanci Melo, sua mulher e esteio) o “Jornal Opção”, que, em dezembro deste ano, fará 50 anos. O “Opinião”, como o nome indica, abria espaço para o debate de ideias, com conhecimento e firmeza, o que agradou e inspirou o jornalista de Goiás, que, tal como Fernando Gasparian, tinha excelente formação intelectual (leitor de Marx e Kant, por exemplo).

Fernando Gasparian está sendo biografado pelo jornalista Márcio Pinheiro, revela Ancelmo Gois, colunista de “O Globo”.

Nascido em São Paulo, em 1930, Fernando Gasparian era de ascendência armênia. Seu pai, Gaspar Gasparian, era industrial do setor têxtil. Eram ricos.
Em 1952, formado em engenharia civil e elétrica, Fernando Gasparian começou a trabalhar na empresa da família.

Em 1953, ainda que não fosse um militante ativo, filiou-se ao Partido Socialista Brasileiro. O PSB, como o nome indica, é socialista, mas não é comunista.

Ao lado de Matos Pimenta (o dirigente), Almino Affonso, Marcos Pereira e Rubens Paiva (sim, o pai de Marcelo Paiva, do livro que deu origem ao filme “Ainda Estou Aqui”), Fernando Gasparian passou a escrever no “Jornal de Debates”. Com os amigos e aliados, defendia a manutenção da Petrobrás e o monopólio estatal do petróleo. Eram nacionalistas e progressistas ferrenhos. Nada a ver com os fakes atuais.

Fernando Gasparian (em pé), Helena Gasparian, Marcus Gasparian, Laura Gasparian e o empresário e ex-deputado federal pelo PTB Rubens Paiva (sentado) | Foto: Arquivo Pessoal

No campo sindical-patronal, Fernando Gasparian foi presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação e da Tecelagem.

Em 1960, se filiou ao Partido Democrata Cristão (PDC), acompanhando o aliado Franco Montoro. Em 1961, o empresário assumiu, como interventor, o comando da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Ativo no meio empresarial, Fernando Gasparian comprou, em 1964, a América Fabril, empresa têxtil do Rio de Janeiro.

Com a criação do bipartidarismo, já na ditadura civil-militar, o empresário contribuiu para a fundação do MDB. A ditadura começou a persegui-lo. Não por ser comunista, o que não era, assim como não o era Rubens Paiva (um político, a rigor, de centro, adepto de um capitalismo socialdemocrata). A perseguição se dava porque Fernando Gasparian não apoiava a ditadura e era um de seus críticos mais agudos.

Na década de 1970, trabalhou no Centro de Estudos Internacionais da Universidade de Nova York e deu aulas de economia no St. Anthony College, na Universidade de Oxford. (Note-se que, mais tarde, talvez por influência de Fernando Gasparian, Herbert de Moraes Ribeiro se formou em economia na Universidade Católica de Goiás.)

Em 1972, de volta ao Brasil, Fernando Gasparian lançou o semanário “Opinião”, que abrigou a fina flor da oposição intelectual e jornalística à ditadura. O sociólogo Fernando Henrique Cardoso escrevia em suas páginas. (Fernando Henrique, que ainda não era FHC, dizia que era possível crescimento econômico mesmo numa ditadura. O economista Celso Furtado, possivelmente por razões ideológicas, garantia que crescimento econômico e regime autoritário eram incompatíveis. Para quem se interessava pelo debate, Herbert de Moraes Ribeiro recomendava vivamente o livro “Modelo Político Brasileiro”, do sociólogo.)

Emilio Garrastazu Médici e Ernesto Geisel: os dois perseguiram Fernando Gasparian | Foto: Reprodução

Além do jornal, Fernando Gasparian comprou uma editora, a Paz e Terra (era de Ênio Silveira), para refinar, ainda mais, o debate intelectual. Era especializada em ciências sociais. O objetivo era entender o Brasil e o mundo para garantir uma intervenção política crítica e embasada.

Em 1973, Fernando Gasparian publicou o livro “Capitais Estrangeiros e Desenvolvimento na América Latina”.

Em 1975, sempre ativo e irrequieto, o político, empresário e intelectual lançou “Cadernos de Opinião”, uma publicação mensal. Era para refinar a crítica e torná-la mais profunda. O objetivo era “desmontar”, de maneira objetiva e arguta, os alicerces econômicos e políticos da ditadura. O Milagre Econômico, por exemplo, não iria durar para frente. Como não durou. E, ao contrário do que postulava o ministro Delfim Netto, o bolo não foi repartido com as classes médias e os pobres. Eles puderam comprar televisão e geladeira — a “picanha” da época — mas tiveram seus salários achatados. (O esperto Delfim Netto falsificou até o cálculo da inflação.)

Já no governo do moderado Ernesto Geisel, Fernando Gasparian foi preso porque publicou em “Cadernos de Opinião” uma conferência do arcebispo dom Hélder Câmara, que a ditadura amava odiar. A ditadura apreendeu todos os exemplares possíveis.

Processado, supostamente por ter infringido a Lei de Segurança Nacional, acabou absolvido. A ditadura às vezes era aloprada, mas seu artífice intelectual, Golbery do Couto e Silva, era um racionalista, um iluminista de direita.

Como não desistia de seus projetos, Fernando Gasparian relançou a publicação, agora com outro título, “Ensaios de Opinião”, ainda mais densa e crítica (mas não panfletária).

A linha dura, a extrema direita militar, não perdoava a capacidade crítica de Fernando Gasparian, sobretudo o fato de agregar os críticos mais atilados da ditadura. Por isso, em 1976, militares — a tigrada — jogaram uma bomba na sede do “Opinião.

O “Opinião” parou de circular em 1977, quando a distensão seguia firme, aproximando-se da Abertura. Vivia-se sob o governo do general Ernesto Geisel, que procurava isolar e controlar a linha dura (que voltou a agir, em 1981, no governo de João Figueiredo, com o atentado do Riocentro).

Com o fim do “Opinião, Fernando Gasparian dedicou-se à Paz e Terra (que ainda existe, mas não está mais sob o controle da família). A editora publicou excelentes livros de Fernando Henrique Cardoso e Kenneth Maxwell (uma obra decisiva sobre a Inconfidência Mineira), entre outros.

Em 1979, com o avançar da Abertura, já no governo de João Figueiredo — o general que “não” prendia nem arrebentava; só ameaçava —, Fernando Gasparian se tornou um dos fundadores do PMDB. Partido que, em Goiás, acolheu Iris Rezende, Henrique Santillo, Fernando Cunha, João Divino Dornelles, Luiz Soyer, Adhemar Santillo, Juarez Magalhães, Juarez Bernardes, entre outros.

Eleito deputado federal constituinte, em 1986, filiado ao PMDB, Fernando Gasparian brilhou na elaboração da Constituição de 1988. Era, por assim dizer, um empresário nacionalista. Um dos críticos mais enfáticos dos juros altos e do capital puramente especulativo.

(Me servi, para a composição do texto acima, de um artigo de Sergio Lamarão inserto no excelente “Dicionário Histórico-Brasileiro”, da Fundação Getúlio Vargas, e de uma nota de Ancelmo Gois, publicada em “O Globo” no sábado, 1º. No filme “Ainda Estou Aqui”, de Walter Moreira Salles, Fernando Gasparian é interpretado pelo ator Charles Fricks; Maeve Jinkings faz sua mulher, Dalva Gasparian. Rubens Paiva e Fernando Gasparian foram sócios no “Jornal de Debates”, em 1953, sob o governo do presidente Getúlio Vargas.)

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