Membro de uma geração que “reinventou” o jornalismo econômico no Brasil, Matías Molina morre aos 87 anos

Matías Molina ficou conhecido, nos últimos anos, como um brilhante historiador do jornalismo, ou melhor, de jornais. Escreveu dois livros imprescindíveis: “Os Melhores Jornais do Mundo — Uma Visão da Imprensa Internacional” (Globo, 680 páginas) e “A História dos Jornais do Brasil” (Companhia das Letras, 560 páginas).

“Os Melhores Jornais do Mundo” contém uma visão muito bem-informada e única no país, além de atualizada. Com as facilidades da internet, os leitores poderão checar a pertinência das interpretações de Matías Molina. Os livros são uma espécie de operação de um ombudsman histórico de jornais.

“A História dos Jornais do Brasil” é quase uma história completa, mas ainda lacunar, considerando que o país é um gigante geográfico ainda, em termos de jornais, pouco conhecido em todos os Estados. Os livros são catataus, mas, como Matías Molina escrevia muito bem, com fluência rara nestes tipos de “tratados”, a leitura é prazenteira.

Reconstruir a história dos jornais, tanto no Brasil quanto no mundo, era, por certo, uma maneira de Matías Molinas não se aposentar. De permanecer ativo. O trabalho prazeroso e criativo retarda ou até impede a velhice, a do cérebro, ao menos.

Matías Martínez Molina, o prenome e o sobrenome indicam, não era brasileiro. Primeiro, Matías, com acento agudo no “í”. Depois, Martínez e Molina. Ele nasceu em Madri, na Espanha, em 25 de julho de 1937, nos tempos convulsos da Guerra Civil Espanhola (1936-1939).

Depois de viver uns tempos na Espanha de Franco, mudou-se, com a mãe, para o Brasil. Tinha 17 anos. Naturalizou-se brasileiro em 1970, aos 33 anos, a idade com a qual Jesus Cristo morreu. O espanhol renasceu, agora como brasileiro, e para sempre. Pois morreu no Brasil, aos 87 anos, na segunda-feira, 21.

Não é a morte, pedacinho da vida, que define um indivíduo. É a vida toda, maior do que a morte, que importa. Matías Molina teve uma vida rica como jornalista e, também, como historiador do jornalismo.

Morando no Brasil, Matías Molina trabalhou como correspondente do jornal argentino “El Mundo” e, na revista brasileira “Direção”, se tornou redator.

No ano do golpe de Estado civil-militar de 1964, aquele que a “Folha de S. Paulo” apoiou alegremente, Matías Molina passou a trabalhar no jornal da família Frias (ele acrescentaria: e Carlos Caldeira).

Claudio Abramo — que revolucionou tanto o “Estadão” quanto a “Folha” — e Roberto Müller Filho se tornaram espécies de mentores jornalísticos de Matías Molina.

Na segunda metade da década de 1960, Matías Molina integrou a equipe que criou a revista “Exame”, da Editora Abril. Por muitos anos, foi a melhor revista de economia do país, competindo com o diário “Gazeta Mercantil”. E hoje? É uma revista…

Em seguida, acompanhando Roberto Müller, Matías Molina começou a escrever na “Gazeta Mercantil”. Trata-se de um dos melhores jornais de economia da história do Brasil. Um pioneiro. Graças ao talento da equipe montada por Roberto Müller.

Pela “Gazeta” passaram, deixando suas pegadas competentes, Celso Pinto (mais tarde, fundador do “Valor Econômico”, o sucessor da “Gazeta”, de propriedade da família Marinho, depois de uma breve sociedade com os Frias, da “Folha”), Célia de Gouveia Franco (autora de ótimo livro sobre a “Gazeta”, que, além de uma biografia do jornal, é, digamos, uma biografia do seu corpo jornalístico), Ângela Bittencourt, Cláudia Satafle, José Casado (agora na “Veja”), Miriam Leitão e, entre tantos outros, Vera Brandimarte.

A “Folha de S. Paulo” (a partir de um texto do “Estadão”) transcreve uma fala de Célia de Gouvêa (que poderia publicar uma biografia, ou biografias, dos fazedores da “Gazeta”; afinal, sem a “Gazeta”, possivelmente, não existiria o “Valor”, seu filho mais conhecido e persistente): “Matías Molina foi um exemplo raro de jornalista que se notabilizou ao exercer várias funções da profissão, cada uma delas exigindo qualidades diferentes entre si”.

Célia de Gouvêa frisa que Matías Molina “foi talvez o maior mentor de repórteres no jornalismo econômico. Sabia contratar e treinar jovens jornalistas, muitos dos quais se tornaram estrelas da profissão”.

Reportagem do “Estadão” relata que colegas descrevem Matías Molina “como um dos melhores repórteres de sua geração, com texto e apuração excelentes, assim como editor detalhista e chefe rigoroso, mas justo e generoso”.

Vice-presidente da CDN, uma agência de relações públicas, Cláudio Pereira foi ao ponto: “Molina foi mais que um jornalista, ele foi um farol no mundo da economia”.

O jornalista Pedro Cafardo, um dos filhos da geração criada por Matías Molina, assinala que “sua principal marca, como jornalista, era a exigência na apuração e no acabamento das matérias. Em plena ditadura militar, com imparcialidade e coragem, o jornal elevou o nível do debate econômico e conquistou também enorme influência na política”.

Matías Molina era casado com a jornalista Cynthia Malta e pai de Maurício e José Victor Longo Martínez.

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