O vizinho Peru e o Brasil têm muitas características bastante próximas, mas também muitas diferenças, como não poderia deixar de ser.
Sul-americanas, ambas, são nações extensas e populosas, embora o Brasil tenha uma extensão territorial bem maior, da ordem de 6,5 vezes a do vizinho e uma população também maior, na mesma ordem de grandeza, o que resulta em densidades populacionais quase idênticas.
Brasil e Peru têm PIB per capita próximos e IDH também bastante parecidos. São bastante diversificados geograficamente, com parte do território na região Amazônica.
O Peru tem seu clima influenciado pela Cordilheira Andina, não sendo predominantemente tropical, como ocorre em nosso país. São exportadores de matérias primas, mas enquanto o Peru tem predomínio de minerais em sua pauta de exportação, o Brasil é grande exportador de produtos agrícolas.
Ambos os países são de colonização ibérica, mas no Peru aportaram os espanhóis com uma colonização de conquista, com Francisco Pizarro (1476-1541) chegando em 1532 e esmagando os incas.
No Brasil chegaram os portugueses em 1500, com sua colonização de comércio, convivendo em paz com os nativos.
Peru e Brasil se formaram países multiétnicos, onde se mesclam os autóctones, os europeus colonizadores e os africanos trazidos como mão de obra escrava, além dos imigrantes europeus e asiáticos mais recentes.
Mas enquanto na etnia peruana predominaram em 2/3 os indígenas, na brasileira predominam, na mesma proporção, os europeus, o que se deve à chegada dos colonos portugueses, desde o Descobrimento.
Brasil e Peru se tornaram independentes da colonização europeia praticamente na mesma época.
José de San Martin (1778-1850) foi o pai da Independência peruana, proclamada em agosto de 1821, mas seguida de uma guerra que durou três anos, até a derrota final dos espanhóis, enquanto D. Pedro I fazia a independência brasileira em setembro de 1822.
A história política dos dois países correu mais ou menos paralelamente, e no final do século XIX, ambos enfrentaram guerras com vizinhos. O Brasil guerreou o Paraguai, saindo vencedor, enquanto o Peru guerreou o Chile, perdendo e tendo que ceder parte de seu território.
Na Guerra Fria, tanto o Peru quanto o Brasil experimentaram regimes militares, com a derrubada de presidentes fracos e condescendentes com as ambições soviéticas: Fernando Belaúnde no Peru, em 1968 e João Goulart no Brasil, em 1964. Belaúnde voltaria à Presidência em 1985, enquanto Goulart morreria no seu exílio argentino, em 1976.
Neste século XXI, também convergências e divergências estão presentes na história dos dois países.
Nestas duas primeiras décadas, foram eleitos presidentes do Peru: Alejandro Toledo (2201-2006), Alan García (2006-2011), Ollanta Humala (2011-2016) e Pedro Pablo Kuczynski (para o período 2016-2020, mas que renunciou em 2018).
Exceto Kuczynski, todos militaram na esquerda peruana. No Brasil, e aproximadamente no mesmo período, foram eleitos: Lula da Silva (2003-2007 e 2007-2011) e Dilma Rousseff (2011-2015 e 2015-2019, mas sofrendo impedimento em 2017). Ambos de esquerda.
Uma das características do governo federal brasileiro nesse período foi a corrupção, que ficou bem evidente em episódios muito marcantes, conhecidos como Mensalão, Petrolão, Operação Lava-Jato e outros menos votados.
A presença de grandes empreiteiras nesses lamentáveis episódios foi uma marca, e a mais notória delas foi a Construtora Odebrecht.
Grandes obras construídas sem licitação, sempre com verbas públicas ou financiadas pelo BNDES — o que dava no mesmo —, no Brasil ou no exterior, preços superfaturados e propinas, muitas propinas — essa era a constante.
A Justiça brasileira, na primeira e segunda instâncias, contudo, esteve presente e figurões políticos e empresariais, pela vez primeira, se viram levados às barras dos tribunais, e não poucos foram condenados e encarcerados. Somavam uma centena, entre diretores de estatais, ex-parlamentares, ex-governadores, dirigentes petistas, dirigentes de grandes empreiteiras, doleiros, lobistas e um ex-presidente: Lula da Silva.
Coincidentemente, no Peru, com base nas propinas oriundas da mesma Odebrecht (que para lá fora levada pelo governo brasileiro, e lá fizera várias obras e comprara várias autoridades), a Justiça agira com rigor e processara várias autoridades, empresários, políticos e lobistas.
Os quatro ex-presidentes citados acima e uma candidata a presidente (Keiko Fujimori) terminaram condenados.
E daí em diante, divergência total no trato dos condenados pela Justiça e na maneira de se comportarem as desprezíveis figuras.
No Peru, o ex-presidente Alejandro Toledo, que teria recebido milhões em propina da Odebrecht para facilitar a construção de uma estrada, foi condenado a 20 anos de prisão, esteve foragido nos EUA, mas foi extraditado e cumpre a pena.
O ex-presidente Alan García (1949-2019), acusado de receber propina para facilitar obras do metrô da capital peruana, Lima, também para a Odebrecht, foi condenado a 25 anos de cadeia, mas de vergonha, matou-se com um tiro na cabeça, em 2019, no momento da prisão.
Pedro Pablo Kuczynski está em liberdade condicional enquanto segue seu processo, em que a promotoria pediu 35 anos de prisão. Esteve encarcerado provisoriamente por três anos.
Ollanta Humala foi condenado, bem como a mulher, Nadine Heredia, a 15 anos de prisão por receber propinas da Odebrecht e cumpre pena. Nadine refugiou-se na Embaixada do Brasil em Lima, obteve asilo do governo brasileiro e teve até a mordomia de um avião da FAB para trazê-la para o Brasil. E várias figuras de peso peruanas, ex-ministros inclusive, foram condenados e cumprem suas penas.
Entenda como ficou no Brasil
Os condenados por corrupção em primeira e segunda instâncias passaram a ser, sistematicamente, livrados pelos tribunais superiores.
Lula da Silva, que cumpria pena em Curitiba, foi descondenado pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, sob a alegação de engano de foro processual, sem entrar no mérito das provas.
E outros ministros, como Dias Toffoli, do STF, vêm anulando condenações, multas e delações premiadas.
O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral — para dar apenas um exemplo —, condenado a centenas de anos de cadeia, foi liberado e hoje flana leve e livre nas redes sociais, como se nada houvesse cometido de vergonhoso. Um Alan García às avessas, nem se ruboriza. Valha-nos Deus.
O post Peru puniu os corruptos do caso Odebrecht e o Brasil “despuniu” e “promoveu” seus corruptos apareceu primeiro em Jornal Opção.