No início de maio, foi aprovado na Câmara dos Deputados o projeto que amplia o número de deputados por estado na Casa, de 513 para 531. A matéria aprovada está errada em todos os sentidos: é impopular, imoral e não corrige a distorção entre população dos estados e o número de parlamentares.
É impopular porque os brasileiros não querem mais deputados. Se forem ouvidos, talvez se verifique o desejo de menos parlamentares, motivado, entre outros, pela aprovação em regime de urgência do Projeto de Lei Complementar (PLP) em um mês em que nada caminhou no parlamento.
Com os presidentes da Câmara e Senado fora do país, em maio só o que se aprovou foi o aumento das cadeiras, que favorece o corpo parlamentar; a suspensão da ação penal contra o ex-diretor-geral da Abin Alexandre Ramagem; e algumas homenagens (como aquela à procissão do Fogaréu em Goiás).
A aprovação do PLP por 270 deputados mostra uma verdade mais profunda sobre a mentalidade política brasileira. Sem prioridade, não se decidiu redistribuir recursos finitos, mas expandir o gasto.
É imoral porque o problema foi causado pelos próprios deputados, e a solução custará R$ 64,6 milhões por ano. Esse valor diz respeito apenas ao subsídio dos deputados, e é uma pequena parcela de um custo muito maior em emendas parlamentares dos 18 novos integrantes. Só no ano de 2024 foram gastos R$ 44,67 bilhões em emendas individuais, de comissão e de bancada de estados.
Desde 1993, a Câmara dos Deputados tem o dever de preservar a proporção entre o número de deputados de cada estado e sua população, segundo a Lei Complementar nº 78/1993. Essa lei, (que determinava que “o número de deputados federais não ultrapassará 513 representantes”), nunca foi observada e o crescimento demográfico de determinadas UFs gerou uma distorção.
Provocado pelo governo do Pará, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a redistribuição do número existente de cadeiras. Mas a autora do projeto aprovado em maio, Dani Cunha (UB-RJ), e o relator, Damião Feliciano (UB-PB), decidiram alterar o primeiro artigo da lei de 1993 e aumentar o número de deputados federais.
É errada porque se a lógica do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP) for levada à cabo, deveriam ter sido criadas 50 novas vagas, e não apenas 18. Goiás tem 250 mil habitantes a mais que o Maranhão, mas ambos estados terão o mesmo número de cadeiras na Câmara.
Já a Paraíba, com 3,974 milhões de habitantes, terá duas cadeiras a mais do que o Amazonas, com 3,941 milhões (33 mil habitantes de diferença). O que explica o peso de um cidadão paraibano valer mais do que o de um goiano? O fato de o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos) ser da Paraíba pode ter “pesado” na decisão.
Esse tipo de distorção deveria ser corrigida no Senado, para onde o projeto será encaminhado agora. Mas é improvável que senadores como Ciro Nogueira (PP-PI) queiram tirar a proporcionalidade de seus estados — seu Piauí perderia uma cadeira se fosse feita a redistribuição das 513 existentes.
Conforme os cálculos do jornalista Dayrel Godinho, para que a projeção da DIAP fizesse sentido, a Paraíba e o Rio de Janeiro são os dois estados que deveriam ter muito mais habitantes do que mostrou o último censo, ou dois deputados a menos em um universo de 513.
Levantamento do portal Folha Z mostra como está errado o aumento de 18 vagas, sob argumento de impedir perda de cadeiras por sete estados — Alagoas (-1) Bahia (-2) Paraíba (-2) Pernambuco (-1) Piauí (-2) Rio de Janeiro (-4) Rio Grande do Sul (-2).
Mostra ainda que a distribuição ideal das 531 cadeiras seria deveria dar duas cadeiras a mais para Goiás, e não apenas uma, como ficou acordado. Outros estados que ganhariam são: Amazonas (+3) Ceará (+2) Goiás (+2) Minas Gerais (+4) Mato Grosso (+2) Pará (+5) Paraná (+1) Rio Grande do Norte (+1) Santa Catarina (+5).
Há, por último, o efeito cascata não avaliado pelo texto original de Dani Cunha. O aumento das cadeiras na Câmara causa aumento nas assembleias legislativas estaduais seguindo o princípio da paridade entre os órgãos. Ao todo, serão mais 30 deputados estaduais — sendo o estado do Pará e Santa Catarina os que mais aumentaram, com quatro novos parlamentares cada.
Goiás terá apenas um deputado a mais na Assembleia Legislativa de Goiás (Alego). De acordo com o site da transparência, o valor referente a um deputado na Alego é de aproximadamente R$ 25 mil, sem contar com verbas indenizatórias por líderes de comissão e auxílios de representação.
No final das contas, se o Senado aprovar e o presidente sancionar, o aumento de cadeiras no Congresso Nacional não consertará o dano histórico da representatividade. Será ainda um acréscimo ao fardo do Congresso e uma mostra de que as prioridades do parlamento não coincidem com as da população.
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