Acusado de matar agricultora vai a julgamento nesta semana

Acusado de matar Neurice Torres, popularmente conhecida como Dona Neura, Sidronio Alves de Lima será julgado nesta terça-feira, 23, em Minaçu. A agricultora foi brutalmente assassinada no dia 11 de setembro de 2022, em sua casa, na zona rural do município de Minaçu. O Tribunal do Juri será realizado no Fórum da cidade, a partir das 9h da manhã, e o caso será julgado pelo promotor Daniel Venuto.

Ao Jornal Opção, a filha de Neurice, Paula Torres, disse que desde a morte da mãe ela e os irmãos vivem em uma constante turbulência. “Enfrentamos uma instabilidade tremenda, pois não temos certeza do que vai acontecer. O desejo por justiça é enorme. Temos muito medo de que tudo isso termine sem a devida justiça, o que nos deixa extremamente aflitos, com o coração apertado. Parece que até hoje não tivemos a oportunidade real de passar tempo com minha mãe e nos despedir dela, dizendo ‘pode ir, está tudo em paz’”.

O inquérito da Polícia Civil de Goiás (PCGO) e processo crime apontam Sidronio, ex-marido de Neurice, como autor do crime. Os dois estavam separados desde 2017, quando ela o denunciou por agressão e tentativa de estupro. O acusado está preso desde 8 de outubro de 2022, quando, após 27 dias foragido, foi capturado em uma barreira policial. Ele já tinha prisão preventiva determinada pela Justiça.

Segundo o processo, provas juntadas ao processo apontam que Sidronio foi o autor do feminicídio, entre elas uma mensagem enviada por Neurice para sua filha pouco antes de sua morte. No texto, ela relatava sentir muito medo, porque Sidronio havia chegado à sua casa e estava tentando entrar na residência. Uma das filhas do ex-casal faz parte do conjunto de testemunhas de acusação. Em vídeos divulgados, outros filhos narram violências de Sidronio presenciadas por eles contra Neurice.

Mulheres do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra do Estado de Goiás (MST-GO), do qual Neurice fazia parte, exigem justiça e punição ao culpado pela morte de agricultora: “Nós, enquanto movimento social, deixamos claro que não permitiremos que a impunidade se faça presente e faremos todos os esforços para alcançarmos a justiça por Dona Neura”, disse Amélia Franz, da direção estadual do MST em Goiás.

Neurice era agricultora, militante do MST e assentada da Reforma Agrária. As mulheres do movimento a homenagearam, batizando um acampamento de famílias em Hidrolândia com o nome pelo qual ela era chamada: Acampamento Dona Neura. Elas denunciam a falta de segurança vivida por moradoras da zona rural, onde persiste a ausência total de políticas públicas para a proteção de pessoas expostas à ameaças, como o caso de mulheres que já possuem medida protetiva contra ex-companheiros, que vivem sozinhas e que já realizaram denúncias de violência.

De acordo com o advogado que acompanha o caso, Allan Hahnemann, “a expectativa da acusação é que a gente realize um julgamento limpo, que traga toda a verdade, que colham os depoimentos das testemunhas, os quais confirmam, com todos os indícios e provas, a autoria do homicídio realizado pelo Sr. Sidrônio Alves de Lima”.

Neurice Torres deixou 4 filhos, dentre eles Paula. “Eu e mais dois irmãos fizemos faculdade pelo PRONERA, que é um programa do governo para filhos de assentados. A outra irmã também fazia faculdade, mas por algumas dificuldades da vida ela não conseguiu continuar”, explica Paula Torres. De acordo com ela, todos os filhos já haviam constituído família e, na época do crime, a mãe morava sozinha na zona rural de Minaçu.

“O maior medo da gente é a impunidade. Porque a justiça do homem é muito falha, né?”, explica Paula sobre o julgamento.

Sidronio Alves de Lima, ex-marido de Neurice. | Foto: Redes Sociais

Relembre o crime

A agricultora Neurice Torres, de 53 anos, foi achada morta seminua e com cabeça mergulhada em uma caixa d’água no assentamento rural Dom Roriz, onde movara em Minaçu, no norte de Goiás, segundo a Polícia Civil. Na época, o delegado Járder Bruno de Sousa Vieira investigou as circunstâncias da morte e concluiu que as investigações apontam o ex-marido como sendo o suspeito do crime “o qual, após tomar conhecimento da localização do corpo pela polícia, fugiu e ficou foragido”.

O crime aconteceu na madrugada de domingo, 11, de setembro de 2022. Na época, MST lamentou a morta da agricultora, que era membro da entidade. Segundo o movimento, a Dona Neura, como era carinhosamente conhecida no assentamento, foi vítima de feminicídio. “Dona Neura era um exemplo de dedicação e amor com a terra e uma grande defensora da agroecologia. Era uma guardiã do Cerrado e possuía uma presença no MST que inspirava a todos. Um de seus maiores orgulhos era que todos seus filhos estão estudando graças à luta popular”.

Conforme as investigações, o homem já estava casado com outra mulher, e chegou a dizer para os familiares que iria para casa. “Contudo, ele não foi. Foi até o local e praticou o crime, conforme ora apurado”, explicou o delegado. O investigador ainda contou que o ex-marido nunca aceitou o fim do relacionamento e procurava Neurice frequentemente, com o intuito de ter relações extraconjugais, contra a vontade dela.

“A vítima estava despida, de bruços sob uma caixa d’água com a cabeça totalmente submersa. Apresentava sinais visíveis de violência”, finalizou o delegado.

A Comissão Pastoral da Terra também lamentou a morte da agricultora em nota. A direção disse que esteve com Neurice um dia antes do crime apresentando frutos cultivados no assentamento na Festa de Cerrado. “Nossa companheira Neura nos deixa o testemunho de luta, de alegria e de justiça para os empobrecidos que atuam para conquistar e permanecer na terra. A violência que a levou atingiu todas nós, mulheres em luta, e não podemos permitir que o machismo mate a alegria do povo”, lamentou a pastoral da terra.

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