Greve na universidades federais: quem está sabendo?

Rogério Pereira Bastos*

No dia 21 de maio, os docentes da Universidade Federal de Goiás deveriam ter realizado uma assembleia para deliberarem sobre a proposta apresentada pelo governo. Ao final da assembleia, a ideia era que se definisse um plebiscito para decidir se a greve terminaria ou continuaria. Disse “deveriam ter realizado uma assembleia”, pois esta não terminou. Se docentes, a elite pensante deste país, não conseguem debater de forma respeitosa, creio que a situação é grave.

Estamos em greve desde o dia 7 de maio (cerca de 15 dias) e os servidores técnicos administrativos desde o dia 21 de março (mais de 2 meses). Neste período, quem ouviu falar da greve, a não ser membros da comunidade universitária? Poucas pessoas. E por que estamos em greve?

Estamos em greve pela recomposição salarial, pela recomposição do orçamento das universidades federais, por melhores condições de trabalho, por reajuste de benefícios. Estes e outros motivos são justos. Ainda mais justos quando se compara salário de um auditor fiscal, de um policial federal, de juízes com o salário de um professor titular, doutor, em final de carreira.

Por outro lado, 2024 seria o ano em que os calendários anual e acadêmico iriam terminar em 2024. Eu, particularmente, não aguento mais dar aulas até 21 de dezembro e voltar para ministrar aulas em janeiro e fevereiro do ano seguinte. Nem os estudantes querem mais isso. Ninguém aguenta mais. Considerando a pandemia, foram 3 anos em que as minhas férias não coincidiram com as das minhas filhas. Sofrimento para os pais professores e filhos estudantes. E a saúde mental nossa e dos estudantes. Da minha parte, estes motivos são suficientes para não se fazer greve.

Além disso, como o governo federal ainda está negociando com a categoria, a greve deveria ser utilizada se somente as negociações fracassassem. Alguns vão dizer que o governo está enrolando e, provavelmente, está. Mas, após o desastre ambiental no Rio Grande do Sul, todo o esforço está sendo canalizado para salvar nossos irmãos gaúchos, o que jé ustíssimo!

Mas voltando ao título: quem está sabendo da nossa greve? Estão sabendo da greve e, somente aqueles que necessitam da UFG: os estudantes de graduação que estão sem aulas, os formandos que talvez tenham tido suas colações de grau canceladas, os estudantes de pós-graduação (mestres e doutores) que precisam de seus diplomas para subir na carreira. Neste caso, vejo uma incoerência: aqueles que pedem recomposição salarial, prejudicam os que querem subir na carreira e receberem salários um pouco maiores.

Desde 2016, temos percebido um ataque à Ciência e os Cientistas. A pandemia deixou o negacionismo bem evidente: utilização de remédios ineficazes e aversão à vacina contra a Covid-19, seja por conterem chips ou por terem sido feitas em tempo recorde. O termo fake news passou a fazer parte do vocabulário do brasileiro. E estas fake news foram cruéis, pois ocasionaram mortes.

Artigo de Sígolo et al, publicado em 2023 na revista científica Ciência & Saúde Coletiva, mostrou que o conhecimento ou interesse do brasileiro sobre instituições de pesquisa aumentou durante a pandemia da Covid-19. Mas após esta ter acabado, os índices voltaram a percentuais insignificantes pré-pandemia. Estou dizendo que antes da pandemia, 87% dos brasileiros não sabiam dizer um nome de uma instituição de pesquisa. Na pandemia, 40% dos brasileiros sabiam um nome de uma instituição de pesquisa: principalmente Instituto Butantan e Fiocruz. Coincidentemente foram as responsáveis pela fabricação das primeiras vacinas contra a Covid-19. Quase ninguém citou nomes de universidades como instituições que fazem pesquisa. Triste, mas é a realidade: somos desconhecidos da sociedade.

Neste contexto de desconhecimento, uma greve ajuda? Não ajuda em nada. Eu tenho certeza de que temos de fazer ações de divulgação das nossas pesquisas. Mas aí, entra outra questão: estas ações de divulgação (ou popularização) da ciência não são reconhecidas nas universidades e órgãos de fomento. Ainda estamos pensando somente nos artigos científicos que serão lidos pelos nossos parres. E, antes que digam que não é bem assim, diversos pesquisadores de divulgação científica é quem dizem que temos de valorizar estas ações de forma que se criem métricas que possam mensurá-las, como ocorre com artigos científicos (Veja o artigo em que a pesquisadora Sabine Righetti defende a Divulgação Científica Institucional).

E creio que temos de repensar a formação de professores para que estes sejam capazes de entender o método científico. Além dos problemas de infraestrutura das escolas de educação básica e salários baixos, como os professores podem formar cidadãos que tenham uma educação científica se, eles mesmos, não tem esta educação científica. Leia mais.

Desde 2013, venho publicando material de divulgação científica dos resultados das pesquisas realizadas e desde 2018 ministro disciplinas de Educação Científica e divulgação Científica. As publicações de divulgação geralmente não são pontuadas em meu currículo e as pelas disciplinas sofro um certo bullying, pois “será que ele tem competência para ministrar uma disciplina de educação, pois não é da área de ensino” ou ministrar uma disciplina de divulgação se não é jornalista. Também mantenho uma página nas redes sociais: SapoCiência que divulga pesquisas e curiosidades sobre anfíbios. Os cientistas devem aprender a conversar com a sociedade, como devem ser pontuados por estas ações de divulgação. Sobre a necessidade dos cientistas fazerem divulgação, vejam o artigo de Herton Escobar.

Enfim, não vamos brigar porque considero que uma federação de sindicatos é melhor que a outra ou porque quero que o sindicato brigue com o governo. Vamos esquecer a greve e começar a trabalhar para tornar as universidades, em particular a UFG, mais conhecidas pelos brasileiros, para que quando pleitearmos melhores condições de trabalho e melhores salários, a sociedade esteja conosco apoiando as nossas reivindicações e sabendo, de fato, o que ocorre nas universidades. Desafio aceito? Por mim, sim. Mãos à obra!

*Rogerio Pereira Bastos, é professor titular e doutor da Universidade Federal de Goiás.

O post Greve na universidades federais: quem está sabendo? apareceu primeiro em Jornal Opção.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.