Lula acerta no tom em nova comunicação, mas insiste em modelo que causou inflação

Nesta quinta-feira, 30, Lula da Silva (PT) concedeu uma entrevista coletiva já no tom dado por seu novo marqueteiro, Sidônio Palmeira. Por um lado, o presidente da República emplacou um bom momento ao conseguir pautar a imprensa e responder aos jornalistas despojadamente, em um formato que não permite réplicas e sabatinas. Por outro lado, em seu discurso, Lula defendeu o modelo que levou ao aumento da inflação e juros, e insistiu em erros que antecipam um 2026 economicamente problemático. 

Vale destacar que, em quase 1h30 de entrevista coletiva, ficou nas entrelinhas que Lula é candidatíssimo à reeleição, ao contrário do que o presidente sugeriu na semana anterior. Em uma forma de rebater a queda na popularidade apontada pela pesquisa Quaest, o presidente tentou cavar um movimento “fica Lula” ao dizer que não sabia se seria candidato. Agora, a entrevista coletiva sem fato concreto motivador pareceu ter a queda de aprovação como razão. 

De toda forma, o gesto foi positivo para o governo por representar uma mudança de comportamento: o governo gerou pautas em vez de apenas reagir às crises. Nos demais 29 dias de janeiro, Lula foi alvo de críticas suscitadas pelo próprio governo — ameaças de tarifas por Trump, monitoramento do pix, impostos, juros e inflação. 

Ficou também aparente, entretanto, que o governo federal não tem marcas. Em entrevista ao Jornal Opção, Vitor Hugo (o vereador de Goiânia é um dos líderes nacionais na oposição ao PT) afirmou: “Não adianta dizer que é um problema de comunicação. Eles não têm projetos, não têm marca. Os programas do Lula 3 são reedições dos programas do Lula 1 e Lula 2 e Dilma 1 e Dilma 2. É um governo sem objetivo”.

Vitor Hugo repercute um talking point da direita que tem fundamentação na realidade, e que tem ressoado com a população. O próprio slogan — “União e Reconstrução” — remete ao passado, a um período anterior à “destruição”. A retórica faz sentido em período eleitoral, mas, conforme o governo avança, se torna mais difícil sustentar o apelo. Roberto Campos Neto e demais antagonistas estão sendo substituídos e as más notícias econômicas não cessam. 

A previsão do mercado é de que o Brasil deve atingir a maior taxa de juros em quase 20 anos ainda em 2025, quando a Selic pode ultrapassar 15% ao ano na tentativa de conter a inflação. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) indica que a inflação acumulada é de 4.83% em 2024. No país, a meta é de 3%, mas estimativas pessimistas dão conta de que a inflação pode subir até 5,5% ao ano. Se isso acontecer, o juro real chegaria a 7,75% ao ano — na última vez em que isso aconteceu, em 2021 durante a pandemia de Covid-19, o Brasil teve o maior juro real do mundo.

Se o cenário se mantiver, em 2026, soará disparatado ao brasileiro com dificuldades de comprar carne que Lula é o melhor candidato porque foi o garantidor da democracia. Na entrevista coletiva, o presidente afirmou que “a democracia é a coisa de maior relevância na humanidade, não apenas no Brasil”. Pode ser, mas não bastará pedir em 2026 para que o eleitor se lembre do 8 de janeiro de 2023. 

Este, aliás, é o ponto mais preocupante da entrevista — a perspectiva de que poderemos chegar a 2026 sem sequer concordar sobre a razão do problema. Até pouco tempo atrás, o governo dizia que a inflação era fake news e que a alta do dólar fora motivada por fake news. Na entrevista do dia 30, Lula afirmou que “não há medida fiscal prevista para 2025”; ou seja, não haverá corte de gastos. Em outras palavras, o governo ainda não admitiu que a crise inflacionária foi causada pela expansão fiscal da PEC da Transição em 2023, e continuará chamando de “fake news” qualquer tentativa de identificar o problema. 

Muito pelo contrário, Lula deve dobrar a aposta na indução do crescimento da economia pela indução dos gastos públicos. Negando que a inflação tenha qualquer relação com o não cumprimento do arcabouço fiscal, o governo deve seguir tentando equilibrar as contas aumentando a arrecadação com impostos. 

Sobre os tributos, o presidente voltou a falar sobre a isenção de Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil. Este antídoto para a perda do valor do dinheiro dos mais pobres é mais do que justo. Mas convém questionar — como será compensado a renúncia desta receita? Em 2024, a crise dos vetos ao pacote fiscal foi gerada justamente porque, matematicamente, a conta não fechava com a vaga proposta de taxar os mais ricos. A expectativa agora é de que uma proposta melhor desenhada seja enviada ao Congresso. 

A política fiscal expansionista fez o PIB crescer no curto prazo, mas também faz crescer a inflação. Por aumentar diretamente a demanda agregada, os preços de bens e serviços também subiram. Agora, este fator pode ser combinado a um aumento da renda disponível para os mais pobres. O incremento do consumo de bens como alimentos pode acarretar ainda mais inflação sobre esses produtos quando os preços subirem para se ajustar aos salários liberados da taxação sobre IR. Para evitar este tipo de distorção, é importante que a proposta seja cuidadosa e consistente, mas isso não ocorrerá sem que primeiro se admita a motivação do problema. 

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