A paternidade esquecida da calamidade financeira de Goiânia

Na primeira tentativa, não deu. Na última terça-feira, 17, por falta de quórum, foi suspensa a votação na Assembleia Legislativa de Goiás, a Alego, do decreto legislativo enviado pela Prefeitura de Goiânia que declara estado de calamidade pública na Secretaria Municipal da Fazenda. Na segunda tentativa, no dia 19 de fevereiro, a proposta foi aprovada por unanimidade, incluindo votos da oposição (votaram favoráveis os deputados Paulo Cezar Martins, do PL, e Gustavo Sebba, do PSDB). O texto avalizado pelos parlamentares aponta um déficit fiscal de R$ 474 milhões no exercício de 2024 e diz que a declaração de calamidade pública é essencial para a recuperação do equilíbrio fiscal do Município de Goiânia.

A tramitação do decreto na Alego, que precisa apreciar calamidades financeiras como esse enviado pelo Paço Municipal, foi marcada por altos e baixos. Na primeira vez em que foi proposto, junto com o decreto de calamidade na Saúde, os deputados se eriçaram e decidiram barrar, pedindo informações ao Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás, o TCM. O órgão, por sua vez, não recomendou diretamente a aprovação, mas declarou que a Assembleia poderia, sim, fazê-la.

“Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, se lhe aprouver, pode reconhecer a situação de calamidade pública financeira na Secretaria Municipal da Fazenda do município de Goiânia, exclusivamente para fins de reequilíbrio financeiro e de recuperação da capacidade orçamentária e financeira municipal”, destacou o documento emitido pelo tribunal.

Entre as medidas de ajuste fiscal recomendadas estão a limitação de empenhos para equilibrar as contas, renegociação e revisão de contratos irregulares, cancelamento de contratos descumpridos ou contrários ao interesse público e controle rigoroso de gastos com pessoal, especialmente cargos comissionados. Medidas consideradas amargas, mas necessárias para a recuperação de um cenário de guerra deixado em Goiânia pela gestão de Rogério Cruz.

Rogério Cruz. Esse é justamente o nome que parece ter sido jogado já no limbo do esquecimento e desatrelado ao caos experimentado pela cidade nos últimos quatros anos. À época, o cidadão parece ter se acostumado a uma crise diferente por semana. Ora paralisação de médicos e maternidades municipais, ora CMEIs sem servidores – esses, substituídos por trabalhadores da Comurg. Ora montanhas de lixo nas ruas em decorrência da interrupção da coleta do lixo, ora operações da Polícia Civil contra esquemas de desvios de verba em diferentes pastas da gestão municipal, e com nomes ligados diretamente a Cruz no cerne dos conluios imorais.

Não havia pausa, tempo para recuperar o fôlego. Crise puxada por crise, um período ainda vívido na memória do goianiense. No entanto, seu agente principal parece estar, aos poucos, ganhando o direito ao esquecimento.

Vale destacar: até o mês passado, as contas do ex-prefeito Rogério Cruz dos anos de 2022 e 2023 ainda não haviam sido apreciadas TCM. Em 2022, o Ministério Público de Contas (MPC) pediu a rejeição prévia das contas da Prefeitura de Goiânia, no entanto, o julgamento é feito pela Câmara Municipal. O processo aguarda ser levado ao Plenário do Tribunal.

Contudo, é claro e notório que Cruz deve ter (muitos) problemas em razão da situação com que deixou Goiânia. Presidente da Assembleia Legislativa de Goiás, Bruno Peixoto ressaltou, em entrevista recente ao Jornal Opção: Rogério Cruz “não podia ter deixado um déficit como deixou”.

Mas a correta prestação de contas parece não ser o forte do ex-chefe do Executivo municipal. No ano de 2023, o TCM deu ao Município de Goiânia a opção de enviar os dados eletrônicos relacionados aos atos de pessoal e as folhas de pagamento. O processo gerou a assinatura de um Termo de Ajuste de Gestão (TAG), pedido feito pela própria Prefeitura. Porém, a gestão de Cruz não cumpriu com os prazos e acordos pedidos pela própria gestão. No final do ano de 2024, o Tribunal declarou o descumprimento do TAG.

A aversão do ex-prefeito à prestação de contas beira o cômico. Quem não se lembra do fatídico 13 de dezembro de 2024, quando Rogério Cruz abandonou a audiência da prestação de contas na Câmara Municipal de Goiânia. O então líder do Executivo saiu da reunião durante apresentação dos dados com a justificativa apontada foi uma reunião com a equipe de transição do prefeito Sandro Mabel (UB). situação deixou os vereadores presentes revoltados.

Enquanto o Estado e o Município se desdobram para tentar juntar os cacos de uma gestão desastrosa, se não criminosa, a informação que circula nos bastidores é que o ex-prefeito se prepara para abrir… uma igreja. Pois Deus queira que todos os desacertos e desmandos cometidos nos últimos quatro anos sejam esmiuçados e trazidos à luz dos órgãos e autoridades competentes o quanto antes.

Não nos esqueçamos disso. Não se decreta calamidade pública na Secretaria Municipal da Fazenda sem razão. Se houve aval, é porque estamos à beira do precipício financeiro. E o decreto aprovado na última semana tem pai.

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