Pesquisas realizadas por cientistas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) revelaram a presença de compostos químicos potencialmente perigosos em fórmulas infantis comercializadas no Brasil. As análises detectaram agrotóxicos, inclusive substâncias proibidas no país, além de micotoxinas e resíduos de medicamentos veterinários.
Publicadas nos periódicos internacionais Journal of Chromatography A (maio de 2024) e Journal of Food Composition and Analysis (março de 2025), as investigações chamam atenção para a segurança desses produtos destinados ao público infantil.
Os dados ganham ainda mais relevância diante do crescimento expressivo do setor: entre 2006 e 2020, o mercado de fórmulas no Brasil registrou aumento de 750%, passando de R$ 278 milhões para R$ 2,3 bilhões, conforme apontado em estudo da revista Globalization and Health.
Na fase inicial da pesquisa, 30 amostras de fórmulas disponíveis no mercado brasileiro foram submetidas a testes. O objetivo era identificar a presença de 23 contaminantes com base em informações da Anvisa, entre eles 19 agrotóxicos e quatro micotoxinas. Embora as concentrações estivessem abaixo dos limites europeus, a detecção por si só acendeu um sinal de alerta, principalmente considerando a vulnerabilidade biológica dos bebês.
Um dos pontos mais críticos observados pelos cientistas foi a presença de carbofurano em 10% das amostras, um pesticida banido no Brasil desde 2017. A explicação provável está na bioacumulação ambiental: mesmo sem uso recente, a substância pode permanecer no solo e na água por anos, eventualmente contaminando a cadeia alimentar.
Outros pesticidas, como fenitrotiona, clorpirifós e bifentrina, também foram encontrados. Paralelamente, os testes identificaram 32 compostos não previstos inicialmente, entre os quais hormônios e fármacos de uso veterinário. A presença desses elementos pode estar relacionada à origem das matérias-primas, como o leite de vaca e de cabra utilizado na formulação dos produtos.
Com o aprofundamento da análise, os pesquisadores ampliaram a triagem para um total de 278 substâncias químicas. O resultado foi ainda mais preocupante: seis compostos foram encontrados em 86,6% das amostras. Entre eles estavam a ftalimida, a cis-1,2,3,6-tetrahidroftalimida e o pyridaben, detectados em níveis acima dos limites tolerados pela União Europeia. O metamidofós, agrotóxico banido no Brasil desde 2012, também foi identificado.
Na avaliação dos autores do estudo, os contaminantes podem ter sido introduzidos em diferentes pontos da cadeia produtiva, desde a produção da matéria-prima até o envase. A pesquisadora Marcella Vitória Galindo, autora da tese que deu origem ao trabalho, destaca que, mesmo em pequenas quantidades, essas substâncias representam riscos. “O sistema de desintoxicação dos bebês ainda está em desenvolvimento, o que dificulta a eliminação desses compostos”, afirma.
Entre os fatores que agravam o cenário está a falta de regulação específica no país para contaminantes em fórmulas infantis. Diante dessa lacuna, os pesquisadores basearam sua análise nos padrões da União Europeia. Para a professora Helena Teixeira Godoy, orientadora da pesquisa, a ausência de normas claras inviabiliza o controle eficaz de qualidade. “Não basta existir legislação se não há como fiscalizar seu cumprimento”, observa.
Vale destacar que os produtos analisados foram coletados em 2023, e os lotes testados já não estão disponíveis no comércio. Por critérios éticos, os nomes das marcas envolvidas não foram divulgados. Segundo os autores, o objetivo do estudo é fomentar o aprimoramento das práticas regulatórias, e não criar pânico entre os consumidores. “O processamento industrial é importante e pode garantir segurança, desde que feito com rigor e dentro dos parâmetros adequados”, conclui Godoy.
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