Romance de Peter Handke revela a complexidade da vida e as flutuações do processo criativo

Carlos Willian Leite

Décimo quarto livro (14º) lido em 2024: “Ensaio Sobre o Louco por Cogumelos”, do austríaco Peter Handke.

Um advogado do Tribunal de Haia, impecavelmente de terno e gravata, no meio de uma floresta, absorto na coleta de fungos. Um homem, habitualmente imerso na rigidez de leis e litígios, vê-se progressivamente desligando-se do concreto e do palpável, navegando pelo reino etéreo e enigmático dos cogumelos. Seu propósito ultrapassa a mera coleta; ele aspira a compilar e redigir um tratado micológico definitivo, um compêndio que não apenas cataloga, mas também celebra a diversidade e o mistério dessas formas de vida.

O romance-ensaio é uma reflexão paródica, um espelho que reflete não apenas a peculiar odisseia do protagonista, mas também ressoa com a trajetória pessoal do escritor austríaco Peter Handke, de 81 anos. Uma alegoria do processo de escrita que revela a beleza e o tormento encontrados na criação literária. O dilema perene entre o impulso incontrolável de expressão criativa e as barreiras impostas tanto pela mente do autor quanto pelas convenções sociais.

Peter Handke: escritor austríaco, Prêmio Nobel de Literatura | Foto: Reprodução

O livro é, em essência, um ensaio sobre a condição humana — abordando desde os anos formativos da infância, passando pelos desafios e revelações da maturidade, até a inevitável dissolução do eu. O elo que conecta a narrativa e as histórias que se ramificam e entrelaçam é a obsessão singular do protagonista por cogumelos, uma paixão que se torna uma metáfora para as obsessões que consomem a alma e direcionam toda uma vida.

“Ensaio Sobre o Louco por Cogumelos” (Estação Liberdade, 160 páginas, tradução de Augusto Rodrigues) é um vasto e envolvente retrato da experiência humana, reminiscente do pensamento do filósofo Robert M. Pirsig. Revela as complexidades da vida, as flutuações inerentes ao processo criativo e a incessante busca por um propósito em um mundo que, muitas vezes, mostra-se indiferente às nossas mais ardentes aspirações.

Magistral. Nota: 10

Carlos Willian Leite é poeta, jornalista, crítico literário e editor da “Revista Bula”.

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